Apenas um respiro.

Com toda pinta de que deve repetir a volatilidade de 2013, com um mês em alta, outro em baixa, com grande dispersão setorial e nível de utilização da capacidade insta- lada estagnada em patamar elevado, a produção física da indústria medida pelo IBGE cresceu em janeiro, mas sem recuperar a grande queda de dezembro e informar um viés. A produção industrial cresceu 2,9% em janeiro, vindo de queda de 3,7% em dezembro, e ficou 2,4% abaixo de seu nível em igual mês do ano passado. Em 12 meses até janeiro, a produção também perdeu gás, ao avançar apenas 0,5%, contra 1,2% em 2013. E continua 3,5% abaixo do pico de produção cravado em setembro de 2008, pré-crise global. Embora não seja o setor mais expressivo no Produto Interno Bruto (PIB), com representação de 24,9% (e de apenas 13% de seu segmento mais valioso, o de transformação) — comparada à fatia de 69,4% das atividades de serviços —, a indústria é o fator mais dinâmico do cresci- mento da economia, com ramificações que transcorrem todas as cadeias produtivas de geração de valor. É assim onde há manufatura. Nos EUA, por exemplo, cada US$ 1 gerado pelo setor manufatureiro cria U$ 1,48 de atividade econômica adicional, embora represente só 12% do PIB, segundo pesquisa do Manufacturing Institute. Já no caso do comércio, a criação de valor é de apenas U$ 0,54. E não é só: a indústria responde por 70% da pesquisa e do desenvolvi- mento do setor privado e por 90% de todas as patentes emitidas. Tais relações são análogas no Brasil, exceto pela produção tecnológica muito baixa. O crescimento econômico não engata por isso, embora não seja pela indústria em si, mas pelas sequelas transmiti- das para a economia em geral pelas disfuncionalidades do setor público, especialmente pelo tamanho, viés de cresci- mento e dispersão da arrecadação tributária em atividades não geradoras de valor. Foi-se a produtividade. E com anos a fio sem câmbio vai-se a Competitividade. E está indo o PIB.
 Decadência da densidade
"A indústria passa por uma crise de competitividade, cujas causas mais diretas estão no longo período de taxa cambial valorizada, nos investimentos insuficientes em infraestrutura e num ambiente de negócios pouco favorável", diz análise do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). "Essa crise e o acirramento da concorrência global depois de 2008 estão mexendo com a configuração da indústria nacional, cuja perda de densidade é clara." Não quer dizer que o setor industrial brasileiro esteja moribundo, como ressalva a nota. "Em outros momentos difíceis, a indústria já mostrou ser capaz de reagir. E a expectativa é que, agora em 2014, sobretudo puxada pelos investimentos, a indústria dê sinais de uma reação mais consistente", acresce a análise do Iedi. É algo a ver.
O risco da moeda fraca
O resultado em janeiro do segmento de bens de capital, antecedente da taxa de investimentos na economia, deu algum alento ao otimismo, ao crescer 10% no mês, depois de recuar 12,2% em dezembro, e foi a única categoria de uso a ter alta (2,5%) sobre igual mês de 2013. Mas é preciso cautela quanto ao cenário para o ano. Os principais indicadores de atividade apontaram estabilidade em fevereiro. Além disso, os incentivos de cré- dito para máquinas e equipamentos foram reduzidos. Os economistas contrapõem que a tendência de depreciação da moeda deve favorecer a indústria, ao encarecer a importação e, eventualmente, incitar a exportação. Fato é que nada disso é certo. O grosso da exportação de manufaturados se destina à Argentina e à Venezuela, economias em crise avançada. E a maior parte das cadeias industriais embute insumos importados. Significa que o dólar caro vai inflacionar a indústria antes de incentivá-la. Talvez nem isso.
As tendências emergentes
 "O efeito do câmbio sobre a produção nacional", admite a análise do Iedi, "não é fácil de estimar, e não é certo, já que, em outros países, as moedas nacionais também foram desvalorizadas". No fundo, não há solução simples. A moeda fraca já foi o principal energético das exportações de países industrializa- dos, associada a salários baixos e estrutura de juros e tributária incentivada. Isso tende a ser marginal. O rumo atual, diz a consultoria AlixPartners, de Nova York, é no sentido da convergência salarial (com aumento do salário/hora na China, e da produtividade do trabalho nos EUA e na Europa) e da redução do custo de energia (entre queda de preço, nos EUA, sobretudo, e menor consumo por unidade produzida). Não há mais só o benefício do câmbio desvalorizado para recuperar a competitividade perdida. A tecnologia virou o fator decisivo.
Incentivo para importar
A racionalidade da indústria é mais complexa do que os economistas a imaginam. Com a profusão das novas tecnologias, então, deixou de ser um negócio condicionado pela política econômica (juros, câmbio, salários) e proteção tarifária. A tecnologia da informação encurtou os ciclos de produção e aproximou mercados. No Brasil, além disso, o setor de transformação foi atrasado pela miopia dos governantes, ao desconsiderar a nova demanda gerada pelo aumento real do salário mínimo e transferências de renda. Ela fluiu para os bens de consumo duráveis, o ramo mais internacionalizado da manufatura, ao mesmo tempo em que a política econômica onerava seus custos de produção. Depois de 2006, a reação do governo foi elevar a taxa de proteção desses fabricantes, deprimindo a busca de produtividade. Deu nisso: montamos carros em linha com os montados nos EUA ou iPhone da Apple igual ao chinês, por exemplo, mas a preço maior que os importados e sem custo para exportar. Fizemos política industrial às avessas.


Fonte: JC


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