Eduardo Salomão
Neto, sócio do escritório Levy Salomão, diz que o Brasil é o único país que não
antecipa a cobrança de impostos sobre os rendimentos do dinheiro dos
brasileiros no exterior, além de ter um dos impostos sobre heranças mais baixos
do mundo.
“O
Brasil é o maior paraíso fiscal do mundo”, segundo Eduardo Salomão Neto, sócio fundador
do escritório Levy Salomão, uma banca de advogados que atua em todos os campos
do direito empresarial e que atende principalmente multinacionais e empresas
estrangeiras no Brasil. Em entrevista ao InfoMoney, o advogado diz que o Brasil
é o único país do mundo que não taxa o dinheiro dos contribuintes enviado ao
exterior enquanto ele não trouxer os recursos de volta ao país e que, mesmo em
casos de sucessão de herança, o imposto cobrado será muito menor do que em
países como os Estados Unidos ou da Europa. O Levy Salomão foi um dos
escritórios de advocacia que colaborou enviando sugestões à Receita Federal na época
da redação do projeto que prevê incentivos à repatriação de recursos de
brasileiros no exterior. Leia a seguir os principais trechos da entrevista:
Paraíso dos milionários
O
Brasil é o maior paraíso fiscal do mundo e isso é sabido por poucas pessoas. Os
impostos no Brasil são muito altos para a classe média. Mas um milionário tem
uma situação que não existe em país nenhum do mundo. Se esse brasileiro tiver
uma empresa declarada fora do país, não paga nenhum centavo de imposto enquanto
o dinheiro não voltar para cá. Então os investimentos ficam rendendo juros e,
se você fizer o cálculo financeiro, vai ver que os juros sobre juros serão suficientes
para dobrar o capital investido a cada 12 anos. E o dinheiro ainda pode ficar
em um trust e nunca ser trazido de volta ao Brasil. Mas como fazem outros
países? A cada mês ou ano, a pessoa física que tem uma holding patrimonial em
país estrangeiro paga um percentual do imposto que deverá ser pago. O fato de
ir pagando todos os anos faz muita diferença porque não incidem os juros
compostos.
Imposto sobre herança
Somando
isso ao baixo imposto sobre herança é que sustento a tese do paraíso fiscal.
Porque a pessoa, se tivesse que pagar um imposto sobre herança alto, de certa
forma “anteciparia” o pagamento do imposto mesmo não trazendo os recursos de
volta. Só que o imposto de herança aqui não é alto. Na maioria dos Estados, o
ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação) equivale a só 4% do
patrimônio herdado ou doado. E ainda há dúvidas se isso atinge patrimônio no
exterior porque a Constituição previa que isso deveria ser regulamentado por
lei complementar, o que nunca aconteceu. Eu defenderia bem um cliente com a
tese de que esses 4% não incidem sobre bens no exterior e ganharia na Justiça. Não
é por acaso que o Brasil tem esse regime. Existem forças que determinam que
seja assim. Quando aumenta imposto no Brasil, é sempre sobre a classe média ou
sobre as empresas. Agora o dinheiro que é renda passiva sempre fica intocado.
Por que o governo faz essa escolha? Não sei. Nos EUA, o imposto sobre herança é
de 30%, 40% ou até 50%. O governo brasileiro não está precisando de dinheiro?
Eu acho que seria razoável cobrar um imposto sobre heranças de 30% a 40% aqui também.
Já existe legislação que permite aos Estados elevar o ITCMD de 4% para 8% e,
mesmo assim, a maioria só cobrar 4%. Não entendo por que não aumentam. Esse
imposto sobre heranças é bom porque nossos filhos precisam fazer a vida deles.
Os filhos devem receber a parte da herança que não cabe ao Estado. É razoável
que eles recebam uma boa parte de forma que possam manter um bom nível de vida,
mas não acho que eles precisem receber quase tudo que o falecido tinha. Nos
EUA, o Warren Buffett e o Bill Gates lideraram um movimento pela tributação
ainda maior das heranças. Fica uma parte com os herdeiros e o resto é usado
para o bem comum. Nosso escritório passou a ser bastante procurado por famílias
interessadas no tema com a expectativa de que em algum momento o ITCMD suba. O
governo chegou a cogitar essa possiblidade neste ano. Pode ser que aumente o
número de doações como forma de algumas famílias se anteciparem ao futuro aumento
do ITCMD. Mas o fato é que o donatário um dia também vai morrer, e seus
herdeiros vão pagar mais.
Imposto sobre Grandes Fortunas
Não
acho que faça sentido haver no Brasil um Imposto sobre Grandes Fortunas. Tem em
poucos países. Acho que as pessoas já vão pagando Imposto de Renda à medida que
vão acumulando suas fortunas. Então qual é a legitimidade de levar outra
mordida sobre a renda que já foi tributada?
Repatriação de recursos do
exterior
Nosso
escritório colaborou com a redação do projeto que incentiva a repatriação de
recursos de brasileiros no exterior – o que não quer dizer que nossos
comentários tenham sido minimamente aproveitados pela Receita Federal.
Basicamente a proposta diz que se você tem conta no exterior e não declarou,
tem que pagar 35% (17,5% de multa e 17,5% de IR) para legalizar esses recursos.
Mas há vários problemas no projeto. Cobrar IR sobre isso é inconstitucional
porque isso não é necessariamente renda. A pessoa pode ter herdado o dinheiro e
não declarou, por exemplo. Está tecnicamente errado e poderá ser contestado.
Outra pataquada monumental é que o projeto dá anistia por ter conta
nãodeclarada no exterior, mas o crime antecedente, que levou aquele dinheiro
para fora, não está anistiado. O que o governo está oferecendo é perdão a
crimes cobrando algo em troca, que são os 35%. Como o serviço é ruim, acho que
é muito alto o governo cobrar 35%. Não sei dizer se eu aconselharia meus
clientes a aderir ou não. Vai depender do que possa ser sanado no Congresso,
que ainda vai analisar o projeto enviado pelo governo. Mas a tendência é que
muitas famílias optem por não aderir.
Acordos de fiscalização
O
Brasil assinou um acordo com os EUA chamado FATCA que agora obriga os bancos
brasileiros a dar informações ao governo americano sobre contas que americanos
venham a abrir aqui. Os bancos brasileiros repassam essas informações à Receita
Federal que, por sua vez, envia esses dados ao governo dos EUA. Se os bancos
não enviarem as informações, há uma lei americana que autoriza o governo dos
EUA a fazer a retenção de 30% dos pagamentos desses bancos. Então na prática
eles obrigam todo o sistema financeiro a aderir porque é muito gravoso. Mas
nesse acordo tem uma cláusula até misteriosa. O Itaú, por exemplo, vai ter de
enviar todas as informações sobre os americanos que abrirem conta. Se for uma
sociedade com sede no Brasil controlada por americanos, o Itaú tem que informar
do mesmo jeito. Se for uma empresa nas Bahamas controlada por americanos, o
Itaú também tem que repassar a informação à Receita Federal que vai enviála ao
órgão de arrecadação de tributos americano. Mas inverso não vale. O brasileiro
que tem conta em offshore que investe nos EUA não terá suas informações
repassadas ao governo brasileiro. É um mistério por que o governo brasileiro
aceitou fazer assim. Nenhum brasileiro tem medo do FATCA por causa disso. Quem
tem bastante dinheiro sempre abre conta primeiro numa offshore que depois vai
investir nos EUA por conta dos impostos sobre transmissão de herança, que podem
chegar a 50%. Se não declarou o dinheiro, aí sempre usa a offshore. O FATCA só
inclui o brasileiro que tem a conta direto em seu nome nos EUA. E esse tipicamente
declarou tudo.
Fonte:
InfoMoney
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