O Supremo Tribunal Federal autorizou, nesta
quarta-feira (4/2), a capitalização de juros em empréstimos bancários com
periodicidade inferior a um ano. Por 7 votos a 1, o Plenário entendeu que a
Medida Provisória que autorizou o cálculo de juros compostos é constitucional.
Isso quer dizer que os bancos estão autorizados a firmar contratos em que podem
incidir juros compostos em parcelas menores que anuais. A discussão era sobre a
constitucionalidade da Medida Provisória 2.170-36/2001, que em seu artigo 5º
autoriza “a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano”. Em
Recurso Extraordinário com repercussão geral reconhecida, o banco Fiat reclama de
decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que o proibiu de cobrar
juros maiores que 12% ao ano (e que 1% ao mês, portanto). Para o banco, o
acórdão violou o artigo 62 da Constituição Federal, que dá autonomia à União
para, “em caso de relevância e urgência”, adotar medidas provisórias, “com
força de lei”. O relator, ministro Marco Aurélio, foi o único que votou pela
inconstitucionalidade da Medida Provisória. Afirmou que não estavam presentes
os requisitos de relevância e urgência da matéria, já que a Lei da Usura, um
decreto presidencial de 1933, proibia a capitalização. E em 1976, o Supremo
entendeu que o Sistema Financeiro Nacional não se submete à lei. Portanto, já
havia tratamento legislativo e judicial a respeito do tema. A sustentação oral
do procurador-chefe do Banco Central, Isaac Sidney Menezes Ferreira,
entretanto, atacou justamente esse ponto. De acordo com ele, já havia
tratamento sobre a matéria no Brasil, mas também havia enorme insegurança
jurídica. E justamente porque enquanto a lei determinava uma coisa, uma súmula
do STF determinava o oposto. O resultado foram decisões judiciais em todos os
sentidos, segundo o procurador. O BC entrou no caso como amicus curiae, na qualidade de “guardião da moeda”. Na sustentação
feita nesta quarta, Ferreira disse que, como havia insegurança, os bancos
assinavam contratos com juros capitalizados e altíssimos — caso o Judiciário
viesse a declarar o contrato ilegal, o preço dos juros compensaria o risco.
Isso se traduziu em aumento do custo do crédito.
Fio da
meada
A divergência seguiu algumas das balizas
traçadas pelo Banco Central, mas circulou principalmente o entendimento da
ministra Cármen Lúcia. Em uma Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada
contra a MP 2.170-36, cujo julgamento foi interrompido há oito anos por pedido
de vista e nunca foi retomado, a ministra abriu a divergência. Explicou que a
urgência e relevância estavam, sim, presentes. A relevância era a regulação das
operações de crédito do sistema financeiro. A urgência estava no contexto da
época: a insegurança levou ao encarecimento dos juros e o aumento do spread
(diferença entre o preço pago pelo banco e cobrado ao consumidor em
empréstimos), que justificaram uma ação imediata do governo federal. O ministro
Teori Zavascki, o primeiro a votar depois do relator e o primeiro a divergir,
partiu daí e afirmou que a jurisprudência do Supremo em relação aos requisitos
para a edição de MPs é de que a ausência deles é preciso estar “cabalmente
demonstrada”. No caso da relevância, Teori argumentou que é “difícil dizer” que
é irrelevante tratar da regulação das operações do sistema financeiro.Sobre a urgência, Zavascki preferiu optar
pela “conveniência” de não se interferir numa situação que vigora há 15 anos.
Segundo ele, o Supremo não poderia se “transportar para o passado” e dizer que
aquela medida provisória é nula porque não era urgente.
Favor legis
O ministro Luiz Fux apontou que o Supremo tem
retomado um balanço entre o controle judicial e o interesse legislativo. Nesse
caso, votou para que o tribunal entenda a favor da lei e pela legitimidade do
interesse legislativo. “A interferência judicial pode ter consequências
nefastas”, disse em Plenário. O ministro Gilmar Mendes seguiu a mesma linha de
raciocínio. Afirmou que não se poderia fazer uma avaliação retroativa da
situação contemporânea dos anos 2000, pois seria “a diferença entre autópsia e
biópsia”. “Esse escrutínio há de ser feito em favor do juízo adotado à época”,
comentou o ministro sobre o “elemento político da urgência”. Gilmar (foto)
comentou ensinamento do ministro Vitor Nunes Leal sobre técnica legislativa.
Para Nunes Leal, tratar de leis é como acondicionar bombas: “O resultado não é
tão espetacular, mas pode ser igualmente desastroso”.
Norma
em vigor
O relator lembrou aos colegas que a norma
discutida nesta quarta está em vigor há 15 anos, desde agosto de 2001, mas
resultou de diversas reiterações. A primeira versão da MP data de 2000. E no
mesmo ano chegou ao Supremo a Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.316,
parada desde 2004 por pedido de vista do ministro Carlos Velloso — foi nessa
ADI que a ministra Cármen Lúcia expôs seu entendimento. Para o presidente do
Supremo, ministro Ricardo Lewandowski (foto), esses dados “talvez sejam”
indicativos da “complexidade do tema”. Acrescentou que a MP, com a redação
atual, vige desde 2001 sem qualquer manifestação do Congresso — o que pode ser
interpretado como uma aceitação da atitude do Executivo, segundo o presidente.
E a Emenda Constitucional 32, também de 2001, que altera o artigo 62 da
Constitucional, diz que as MPs editadas até a data da promulgação da Emenda (12
de setembro de 2001) “continuam em vigor” até que outra MP a revogue ou até
“deliberação definitiva do Congresso Nacional”. O ministro Teori Zavascki, em
seu voto, disse que isso seria uma forma de o Congresso anuir ao conteúdo da
medida que trata da capitalização. “Dou a mão à palmatória”, disse Marco
Aurélio quando Lewandowski falou da falta de ação do Congresso, se isso quiser
dizer que o Legislativo concorda com “todas as 40 medidas provisórias pendentes
de análise”.
Fonte:
Conjur
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