Com queda de 54% em
um ano, Bovespa já vale menos que a Apple.
Valor da Bolsa
brasileira caiu de US$ 1,14 trilhão para US$ 518 bilhão, com crise e
desvalorização do real.
A crise que afeta o país, com seus
desdobramentos sobre o crescimento da economia e o câmbio, fez com que a
capitalização das empresas abertas brasileiras registrasse, em um ano, a maior
queda entre os 20 maiores mercados acionários do mundo. Levantamento feito pelo
GLOBO com base em dados financeiros da Bloomberg mostra que o valor, em
dólares, de todas as ações negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo
(Bovespa) despencou pouco mais de 54%, de US$ 1,14 trilhão para US$ 518
bilhões, no período de 12 meses encerrado na última segunda-feira. Juntas, as
Bolsas de todo o mundo registaram recuo bem menor, de 8,81% no período. O
encolhimento fez com que o Brasil caísse da 12ª para a 15ª posição do ranking
de maiores mercados de ações do planeta, sendo ultrapassado por Espanha, Suécia
e Itália.
Para efeito de comparação, a Apple sozinha,
com sua capitalização de US$ 640 bilhões — a maior do mundo — vale 23% mais do
que todas as 359 empresas brasileiras negociadas na Bovespa.O tombo na
capitalização brasileira traduziu-se também em uma menor participação no
mercado global de ações. Há um ano, o valor da Bolsa brasileira representava
1,72% dos US$ 66,45 trilhões em papéis negociados no mundo; hoje, a fatia é
exatamente a metade disso, ou 0,86% da capitalização global de US$ 60,59
trilhões. A desvalorização do real, é claro, é um dos principais fatores que
explicam o enxugamento da Bolsa brasileira quando ela é comparada com as do
resto do mundo na moeda americana. Entre as 31 principais divisas globais, o
real foi a segunda que mais perdeu valor frente ao dólar nos últimos 12 meses.
A moeda americana avançou 68,5% sobre a divisa brasileira. Valorização maior,
apenas em relação ao rublo russo: 84,8%. A Rússia é alvo de embargo econômico e
está envolvida em um conflito na Ucrânia. Mas o câmbio, dizem especialistas,
acaba sendo a confluência entre os problemas externos e a crise político-econômica
doméstica. — Há dois lados que explicam as perdas da Bovespa. Lá fora, existe a
expectativa de aumento de juros nos EUA, que tende a valorizar o dólar e a
diminuir a oferta de liquidez para emergentes, e a turbulência na China e seus
efeitos sobre as commodities. E há nossos problemas domésticos, com o governo
em uma verdadeira sinuca de bico, que são mais graves que os dos outros países
— explica Daniel Weeks, da gestora Garde Asset. André Perfeito, economista da
Gradual Investimentos, ressalta a grande exposição da Bovespa às commodities.
Petrobras, Vale e siderúrgicas respondem, juntas, por 17% do índice de
referência Ibovespa, por exemplo. Em um ano, o minério de ferro acumula queda
de 31%, para US$ 57,42 a tonelada, enquanto o barril de petróleo do tipo Brent
despencou 50,6% no período, para US$ 49,52. — Também foi importante, nesse
período, a influência de fatores não econômicos sobre a Petrobras, empresa que
tem peso importante na nossa Bolsa — acrescenta Perfeito, referindo-se ao
escândalo da Lava-Jato, que responde por parte importante do tombo de 60% das
ações preferenciais da estatal em 12 meses.
BOLHA
NA CHINA E POSSÍVEL ALTA DE JURO NOS EUA
Todos os fatores considerados, Weeks resume o
encolhimento da Bovespa como resultado de uma reavaliação das expectativas dos
investidores sobre o crescimento brasileiro. — Se antes crescíamos 4%, agora
todos têm de se acostumar com a realidade de que o Brasil, quando voltar a
crescer, ficará em, no máximo, 2%. Dessa forma, não tem jeito, o lucro das
empresas na Bolsa terá de cair — afirma. — Por isso não considero que a Bovespa
esteja barata em dólar. Caminhamos para a perda do grau de investimento, então
a situação das ações deve piorar ainda mais. A deterioração que afastou
investidores também fica clara no risco associado ao Brasil, medido pelo credit
default swap (CDS, uma espécie de seguro contra calote). O contrato de cinco
anos, em dólar, saltou 185% em um ano, de 131 pontos centesimais para 374 ontem
— nível semelhante a países classificados com grau especulativo. Mas, embora o
recuo da capitalização brasileira tenha sido o mais intenso, a Bovespa não foi
a única a cair em um ano. Na verdade, entre os 20 maiores mercados acionários,
apenas os chineses (o continental e o de Hong Kong) avançaram — com alta,
respectivamente, de 29,3% e 18,8%. Grande parte dos analistas, porém, acredita
que esse salto foi resultado de uma bolha inflada por injeção de capital
estatal. O processo tem sido corrigido nas últimas semanas, o que resultou em
tombos históricos em índices como o da Bolsa de Xangai. É preciso ressaltar, no
entanto, que, não fossem os temores sobre a China, mercados importantes teriam
escapado de uma queda em 12 meses. É o caso das Bolsas americanas. O índice Dow
Jones vinha em patamar aproximadamente 3% superior ao de setembro passado
quando, em meados de agosto, despencou mais de 10% em uma única semana com a
turbulência chinesa. Mas Perfeito acha que, mais do que a questão chinesa, pode
ser mais prejudicial para o Brasil a iminente elevação dos juros pelos EUA, que
desde 2006 estão no intervalo entre zero e 0,25%: — O índice S&P 500 está
em uma região de pontuação recorde. Está todo mundo flutuando no vazio, as
Bolsas dos países centrais estão fora de lugar, sustentadas por esse estímulo.
Se houver aumento da taxa, pode representar um sinal muito claro para uma
realização global de lucros. Para o já combalido mercado acionário do Brasil,
seria um desafio a mais. — A curto prazo, é possível que os juros nos EUA
tenham um impacto importante, pois estamos em um cenário de dificuldade. No
entanto, se considerarmos nossas reservas internacionais e os altos juros
(14,25% ao ano), aplicar no Brasil ainda vai ser muito atraente. Mas é claro
que reduzirá a margem de manobra do Brasil — afirma o economista Luiz Carlos
Prado, professor da UFRJ.
Fonte:
O Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário