Demanda por energia no Brasil é insustentável.

Jannuzzi alerta que mais problemático que problemas estruturais é falta de consumo consciente.

A situação energética do país preocupa com seus reservatórios esvaziados, usinas com impasses para construção e possibilidade de novos custos ao consumidor. As discussões, no entanto, têm adotado mais um viés político do que, de fato, um compromisso ou preocupação com diagnósticos e soluções para estabilizar a oferta de energia no país. Entre as que apresentam saídas, está a voltada à racionalidade do consumo, conforme alerta Gilberto De Martino Jannuzzi, professor da Unicamp. Ele destaca que a crescente demanda de energia elétrica no Brasil pode tomar proporções insustentáveis, que nenhuma nova usina hidrelétrica seria capaz de suprir.  Jannuzzi fez doutorado em Energy Studies pela Universidade de Cambridge, é Diretor Executivo da International Energy Initiative-IEI e, em 2008, recebeu Prêmio Nobel da Paz como um dos colaboradores do Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC). Ele explica que o problema maior que a dificuldade para implantar novas usinas ou tecnologias que deem conta da demanda cada vez maior é justamente perceber que um aumento constante da demanda é insustentável, além de tornar a energia cada vez mais cara. É urgente implantar então uma política de demanda consciente, o que só fazemos quando nos deparamos com uma crise como a de 2001, que impôs um racionamento e poderia ter funcionado para educar os brasileiros, que não seguiram o aprendizado. Existem, de fato, pondera, problemas estruturais no setor elétrico que ainda não foram resolvidos e por isso, “vire e mexe”, precisamos enfrentar problemas conjunturais. Só que o problema é muito maior do lado da demanda, que tem evoluído com o acesso dos mais pobres a um novo padrão de vida, que antes era apenas de uma minoria, por exemplo.  A classe média se expandiu e o ar-condicionado deixou de ser artigo apenas da casa dos “patrões”, com melhor distribuição de renda e acesso a recursos básicos. Falta agora uma conscientização para saber lidar com essa nova capacidade de consumo, para que seja um processo sustentável. O consumo de energia acabou virando um status no Brasil, como ter ar-condicionado em cada cômodo da casa, por exemplo, em um movimento contrário do que já acontece em outros países. “Estamos construindo prédios, cidades, usando uma arquitetura que não está associada ao nosso clima, vai depender sempre de climatização. Estamos criando uma demanda desnecessária de energia elétrica." Jannuzzi destaca medidas positivas e negativas adotadas nos últimos anos, do ponto de vista da demanda da energia elétrica. Uma das positivas foi a redução do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) de eletrodomésticos mais eficientes, que inclusive, acredita, poderia ter sido uma medida mais agressiva, implantada em dezembro de 2011. Sugere ainda que poderia ter sido incentivado que aparelhos ainda mais eficientes fossem colocados no mercado. As não muito eficazes seriam, por exemplo, o incentivo ao consumo, “quando o mundo inteiro está fazendo o inverso”, e a redução de tarifas, que gerou problemas de sustentabilidade financeira para um setor “tão crítico”. “Nós temos uma política de incentivar o uso eficiente de energia, mas, na prática, há uma falha enorme. Existe todo um discurso que é feito, mas isso nunca foi atacado de maneira satisfatóri.” Fazer uma nova usina, lembra, sai muito mais caro que pensar em uma política de controle da demanda. "Todos os consumidores pagam mais de R$ 300 milhões, por ano, usados em programas de eficiência energética. No Rio, a Light, como outras distribuidoras de energia, destaca Jannuzzi, gasta entre R$ 30 milhões e R$ 40 milhões por ano em programas de eficiência energética, número razoável, que vem embutido na tarifa, e que teríamos que saber que impacto têm na redução do consumo, na melhora da tarifa. Medidas como essa saem mais barato do que produzir energia, mas ainda “não conseguimos demonstrar o impacto desses programas, que já são realizados há mais de 10 anos”. Questionada sobre os resultados do seu programa de eficiência energética (PEE), a Light informou ao JB, pela assessoria de imprensa, que o PEE apresenta diversos benefícios, tanto para sociedade, quanto para os consumidores beneficiados pelos projetos e para o setor elétrico/concessionária. Para a sociedade, informa, "a economia obtida com os projetos, em termos de energia economizada e redução de demanda na ponta, é muito superior aos custos de expansão do setor elétrico, considerando a entrada em operação das usinas termoelétricas, cujo custo para a sociedade é muito elevado". Os projetos do PEE, acrescenta a LIght, possibilitam a manutenção dos níveis de segurança energética em patamares adequados. Há também redução de impactos ambientais pela postergação de investimento em grandes obras de geração elétrica e redução da queima de combustíveis nas termoelétricas. A distribuidora de energia também ressalta que a divulgação de ações de combate ao desperdício e uso eficiente e racional da energia, por meio do PEE, possibilita aumentar a consciência ambiental e energética da sociedade para questão energética. Para o consumidor, existe a redução da conta de energia e melhora da capacidade de pagamento das contas pelos clientes, além do aumento do nível de consciência ambiental e energética para as questões ligadas ao desperdício de energia, afirma a Light. Já para o sistema Elétrico/concessionária, a LIght destaca a redução da demanda de Ponta, com a postergação de investimentos nos sistema de geração, transmissão e distribuição; redução de Perdas Comerciais e Técnicas e Aumento da adimplência dos clientes beneficiados pelo programa. Em relação ao custo do programa embutido na conta dos clientes, a Light aponta que 1% da receita operacional liquida das concessionarias se destina ao Programa e à Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), sendo que este percentual já é um encargo na tarifa de energia elétrica estabelecido por Lei Federal nº 9.991, de 24 julho de 2000. “Temos possibilidades de administrar melhor nosso sistema energético. Temos recursos, temos pessoas, temos inteligência. O que falta é usar bem esse mecanismos e esses recursos financeiros. Deveria ser colocado com muito ênfase. Eu diria que nós nunca fizemos isso [estimular o racionamento] de maneira eficiente, só fazemos isso quando tem crise, e não é assim, temos que administrar essa demanda o tempo todo”, alerta Jannuzzi. Uma sugestão, é que se desenvolva uma política de desenvolvimento tecnológico para garantir que os melhores equipamentos estejam no mercado, e ainda avaliar se os selos oferecidos ao mercado são os mais adequados. "Temos políticas fragmentadas, se fala em construir novas usinas, e cada vez fica mais difícil, tem a questõa do reservatório, a climática e um incentivo ao consumo que poderia ser feito de outra maneira. Consumir eletricidade no Brasil é uma questão de status. Quanto maior a geladeira, para o brasileiro, melhor, é preciso incentivar uma geladeira do tamanho certo, e a melhor que a indústria nacional possa fornecer." O perigo está em insistir na ausência do planejamento da demanda de eletricidade, garantindo um uso eficiente, e não incentivar o consumo por si só consumir. Somos mais ambientalmente evoluídos, explica, quando menos a gente consumir. Como o setor de energia é estratégico para o desenvolvimento do país, é preciso investir em planejamento hoje. Relatório da KPMG divulgado no mês passado, “O Futuro do Estado em 2030” (The Future State 2030, em inglês), apontava para a questão dos governos do mundo inteiro estarem mais focados no curto prazo, devido a motivos como a crise econômica mundial e as suas consequências. “Porém, o momento é crítico e é necessário adotar uma visão de futuro menos imediatista e mais estratégica em relação aos desafios sociais e ambientais que estão mudando em ritmo acelerado”, dizia a empresa.



Fonte: JB

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