"A única função das previsões econômicas é fazer a
astrologia parecer respeitável", dizia o economista canadense John Kenneth
Galbraith. Os críticos da futurologia econômica revisitam a máxima de Galbraith
sempre que desejam reafirmar o quanto os economistas falham quando tentam
antever o futuro. No momento, o futuro que grande parte dos economistas enxerga
para a economia não é nada animador: não apenas o ano de 2015 está perdido, com
retração que ficará em torno de 3,5%, mas também 2016. Para os mais pessimistas
- ou mais realistas, a depender do ponto de vista -, a recuperação só ocorrerá
em 2018. E mais: as previsões, que já eram ruins no início de 2015, só fizeram
piorar desde então. Erram os futurologistas, como dizia Galbraith? Dadas as
condições atuais, a recuperação realmente não parece estar tão próxima.As previsões ficaram piores porque também mais bicudo ficou
o quadro geral. No início de 2015, esperava-se crescimento - sim, crescimento -
para 2015. A projeção era de alta de 0,4% para o PIB, segundo a pesquisa Focus,
realizada com 100 economistas pelo Banco Central semanalmente. Agora, até o
governo - que, por dever de ofício, precisa ser otimista - prevê queda do
produto interno bruto (PIB) superior a 3%. A dificuldade do governo de levar
adiante no Congresso o projeto de ajuste fiscal, a crise política, a piora das
contas públicas e o aprofundamento da Operação Lava Jato, que investiga casos
de corrupção em contratos com a Petrobras, exigiram revisão das projeções. Só
os desdobramentos Lava Jato engoliram 142,6 bilhões de reais da economia, o
equivalente a 2,5% do PIB, segundo estudo da consultoria econômica GO
Associados.O quadro de incerteza leva as empresas a adiar investimentos
e contratações, razão de as previsões terem piorado ao longo de 2015.
"Quando a recessão começa, o desemprego não é imediato, assim como as
contratações não ocorrem logo depois do início da retomada", diz Hélio
Zylberstajn, professor do Departamento de Economia da Universidade de São
Paulo. "Leva alguns meses para o empresário ter certeza de que a retomada
é para valer - e essa certeza ainda está longe de acontecer." As previsões
mais frequentes no momento falam de taxa de desemprego em torno de 9% ao fim de
2015. O número é um contraste com o que se via há apenas doze meses, quando o
desemprego era de menos de 5%. A taxa deve chegar a dois dígitos - as projeções
ficam entre 10% e 12% - no primeiro semestre de 2016.De onde vêm essas projeções? De indicadores como a formação
bruta de capital fixo. Esse indicador registra o quanto as empresas aumentam ou
diminuem seus bens de capital, que é a infraestrutura de máquinas e
equipamentos usados na fabricação de outros produtos. No acumulado entre janeiro
e setembro, a formação bruta de capital fixo recuou 12,7%, segundo o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em relação ao trimestre
imediatamente anterior, a queda foi de 4%, e, na comparação com o mesmo período
de 2014, o declínio foi de eloquentes 15%. Com menos demanda de consumo, as
empresas diminuem sua estrutura de produção e cortam empregos. Depois, quando
veem que a demanda está em recuperação, recompõem seu parque industrial e
voltam a contratar. Todo esse processo leva tempo, como explica o professor
Zylberstajn. Por isso os economistas têm adiado o momento para o início da
recuperação em seus prognósticos.As pedras no caminho do porta-bandeira - O ajuste fiscal era
um ponto central nas previsões para a economia brasileira feitas no início de
2015. Os cortes de despesas e aumentos de impostos propostos pelo ministro da
Fazenda, Joaquim Levy, porta-bandeira do ajuste, eram medidas duras e
impopulares, mas essenciais para o reequilíbrio das contas públicas e a
recuperação da credibilidade no cenário externo. Mas Congresso e governo têm
vivido às turras desde o início do ano - seja por convicção dos opositores,
seja pela pressão da dita base aliada por cargos e vantagens. E, com os
desentendimentos, até agora o ajuste fiscal foi votado por completo. Resultado:
A desconfiança com a capacidade do governo de conseguir aprovação para o ajuste
cresceu. Essa desconfiança puxou a alta do dólar, que, por sua vez, alimentou a
inflação. "Economia é muito expectativa e credibilidade", diz Alexandre
Espírito Santo, professor de finanças do Ibmec, no Rio de Janeiro. "Será
que o governo vai conseguir o ajuste no ano que vem se não conseguiu fazer até
agora? A resposta não é trivial."A desconfiança externa com o quadro da economia brasileira
costuma ser resumida pela avaliação feita pelas agências de classificação de
risco. Em setembro, a Standard & Poor's tirou o Brasil de sua lista de bons
pagadores e pôs o país na lista de "grau especulativo", na qual estão
países e empresas considerados mais arriscados para os investidores. Moody's e
Fitch ainda mantêm o Brasil no patamar dos bons pagadores (ou investment
grade). Ter boa nota na lista dessas agências não é questão de mera vaidade.
Quanto mais altas as notas, menos o país e as empresas pagam para tomar
empréstimos. Esses empréstimos, por sua vez, se transformam em mais
investimentos e empregos. Rebaixamento significa fuga de dinheiro. "Mas a
questão não está só com o investidor estrangeiro. O investidor doméstico também
está desestimulado", diz o economista Luiz Alberto Machado, conselheiro do
Conselho Federal de Economia.O governo pareceu ter conseguido dar passos adiante no
Congresso quando, no fim de novembro, destravou a "pauta bomba",
formada por um conjunto de vetos da presidente Dilma Rousseff a medidas que
aumentariam pesadamente os gastos do governo. Os vetos foram mantidos. Uma
semana depois, a ironia: no mesmo dia em que conseguiu sua maior vitória no
Congresso em muito tempo - e mudança da meta fiscal para 2015, que autoriza o
governo a fechar 2015 com rombo de 119,9 bilhões de reais sem ser enquadrado na
Lei de Responsabilidade Fiscal -, Dilma viu o presidente da Câmara dos
Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), acolher o processo de impeachment contra
ela. Qualquer que seja o desdobramento desse processo, ele exigirá mais embate
entre Planalto e Congresso, o que tende a adiar votações importantes para a
retomada da economia brasileira. "A crise política levou à paralisia do
Congresso, que é o oposto do que precisamos no momento: Um Congresso ágil na
votação das reformas", diz o professor Alexandre Espírito Santo, do Ibmec.
"Estamos paralisados." A piora das previsões, como se vê, não é mero
pessimismo de quem insiste em desafiar a máxima de John Kenneth Galbraith.
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