País deve voltar
agora a exportar petróleo, derrubando ainda mais o preço da matéria-prima, que
já se encontra a níveis historicamente baixos.
O desembararalhar do regime mais complexo de
sanções do mundo começa agora – e já traz complicações para mercados e negócios
em todo o mundo. No sábado, após a comprovação de que o Irã cumpriu sua parte
no acordo nuclear com as potências mundiais, a União Europeia revogou sanções
econômicas que incluíam um embargo à compra de petróleo cru iraniano e
restrições ao comércio com o país. "Este é um dia que estávamos esperando
há anos. Haverá grandes mudanças", disse Michael Tockuss, diretor da
câmara de comércio Alemanha-Irã. "Também tiraremos cerca de 300 indivíduos
e empregos iranianos da lista de sanções da UE. Até agora, não podíamos fazer
nenhum negócio com eles, nem vender pão ou biscoitos." Os Estados Unidos,
por sua vez, retirou sanções que atingiam especialmente o setor bancário. Mas
neste domingo, o governo Obama anunciou uma nova rodada de sanções, desta vez a
11 empresas e indivíduos ligados a um programa de mísseis balísticos no país.
Eles ficarão impedidos de usar bancos americanos. Elas foram anunciadas depois
que o Irã realizou, no último mês de outubro, um teste de um míssil balístico
de precisão, capaz de transportar uma ogiva nuclear. O teste foi uma violação
da proibição das Nações Unidas. Apesar de dizer que o acordo nuclear foi
"inteligente" e comemorar seu resultado, o presidente Barack Obama
afirmou que o país "continuará firme na oposição ao comportamento
desestabilizador do Irã em outras áreas". Mesmo assim, espera-se que o fim
de boa parte das restrições cause sério impacto nos preços do petróleo, que já
estão em níveis historicamente baixos, e no setor financeiro.
As
sanções que terminam e as que permanecem
As sanções econômicas relacionadas com o
programa nuclear do Irã estão em prática desde 2006, por cima de outras que já
existem a décadas. Com a implementação do acordo nuclear, sanções do Conselho
de Segurança da ONU à venda de tecnologia nuclear e de defesa serão anuladas.
Também será revogado o congelamento de bens de indivíduos e empresas. Apesar de
o impacto delas ter sido pequeno comparado às da UE e dos Estados Unidos, elas
legitimavam as ações restritivas de outros países. Além de remover sanções a
setores inteiros como bancos, transporte marítimo e seguros, entidades e
indivíduos que estavam na lista negra por causa de suas supostas atividades
relacionadas ao programa nuclear agora podem fazer negócios com a União
Europeia. No entanto, pessoas na lista de sanções relacionadas ao terrorismo
continuarão excluídas. Os Estados Unidos também mantêm embargos a entidades
acusadas de patrocinar o terrorismo, como a Guarda Revolucionária do Irã. E as
sanções relacionadas ao programa nuclear foram apenas suspensas, não completamente
derrubadas.
Petróleo
mais barato
Antes da imposição do embargo ao petróleo
iraniano em 2012, um em cada cinco barris do Irã ia para refinarias europeias.
O país tem vendido cerca de 1,1 milhão de barris por dia nos últimos anos,
principalmente para a China, a Índia, o Japão e a Coreia do Sul. Teerã afirma
que aumentará suas vendas em 500 mil barris imediatamente após a revogação das
sanções e chegará a 2,5 milhões de barris no próximo ano. Isso levará os preços
ainda mais para baixo. O mercado já está inundado de petróleo barato e haverá
muito mais barris do que compradores. Para atrair seus compradores de volta, o
Irã pretende oferecer descontos em preços que já são os mais baixos em 11 anos.
O retorno completo do Irã ao mercado também poderia dar início a uma guerra de
preços com seu arquirrival Arábia Saudita, que já está vendendo abaixo do preço
de mercado para conseguir manter sua fatia. Para outros produtores, a volta do
Irã ao mercado também é preocupante. Países como Venezuela, Brasil, Rússia e
Angola já sentem o peso da redução do rendimento com as vendas.
Grandes
bancos
O pior gargalo para negócios futuros com o
Irã podem ser os bancos. Apesar de o país poder se conectar novamente com o
sistema financeiro global, ainda não está claro quantos bancos irão aceitá-lo. "Quando
eu falo com os grandes bancos alemães, eles dizem: 'espere a implementação do
acordo nuclear e depois mais um ano, e aí pode falar conosco sobre os negócios
com o Irã", diz o alemão Michael Tockuss. Ao longo dos últimos 10 anos,
autoridades americanas aplicaram penalidades bilionárias a bancos europeus por
contornarem as sanções dos Estados Unidos a Irã, Sudão e Cuba. Líderes dos
setores de negócios alemão e britânico dizem ter pedido um "sinal
verde" do Tesouro americano aos bancos, para que eles voltem a mediar os
pedidos relacionados ao Irã de seus clientes europeus. "Se não
conseguirmos convencer os bancos grandes, que podem nos fornecer valores
maiores, teremos que buscar um número maior de pequenos bancos", diz
Tockuss, cuja câmara de comércio continuou fazendo negócios com o país, graças
a pequenos bancos alemães que não estão expostos ao mercado americano. Mas este
tipo de "microfinanciamento" pode não ser adequado para projetos de
larga escala como as reformas no sistema de trens do Irã, que está sendo feita
pela empresa alemã Siemens, ou a compra de 114 novos aviões comerciais da
Airbus.
Zona
cinzenta
Como se as complicações práticas não fossem
suficientes, também há os entraves legais. Os Estados Unidos estão revogando as
chamadas "sanções secundárias" – que se aplicam a indivíduos ou
empresas não americanos e empresas –, mas as "sanções primárias"
continuam existindo e ainda impedem que americanos do país façam negócios com o
Irã. "Há zonas cinzentas enormes: e as subsidiárias não americanas das
empresas americanas?", indaga a especialista em sanções Maya Lester,
advogada da empresa londrina Brick Court Chambers. O texto do acordo nuclear
diz que negócios com o Irã serão permitidos com a subsidiárias de empresas
americanas, mas isso contradiz as sanções primárias. Por isso, muitas empresas
e seus advogados estão esperando mais detalhes do Tesouro americano antes de
voltar a negociar com os iranianos. Além disso, navegar o regime legal e
regulatório iraniano é como andar em um campo minado. Segundo o parlamentar
conservador iraniano Ahmad Tavakoli, há uma epidemia de corrupção no país. Conseguir
licenças para importação, por exemplo, pode ser difícil sem "pagamentos
extra", o que para muitas empresas estrangeiras, como as britânicas,
significaria violar as leis de seu país. Também não se sabe ainda se o
presidente Hassan Rouhani conseguirá usar o dinheiro arrecadado com o fim das
sanções para baixar a inflação e os altos índices de desemprego no país. Mas
apesar das incertezas, empresas no mundo inteiro estão ansiosas para conquistar
sua fatia do mercado iraniano. Em meio à crise econômica global, a perspectiva
de refazer os laços com o país para ajudar a reconstruir sua infraestrutura,
refazer suas ligações de transporte e servir a 80 milhões de consumidores em
busca de produtos estrangeiros é bastante atraente.
Fonte:
G1
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