Regra contábil faz plataforma turbinar importação do país

Com números recordes, as plataformas de petróleo puxaram as importações e exportações deste ano e distorceram alguns indicadores de comércio exterior. Resultado de uma mudança tributária, o embarque e desembarque de plataformas é predominantemente contábil e reflete em pequena parte operações típicas de embarque e desembarque.

O efeito mais importante se dá nas importações. De janeiro a agosto, as compras de plataformas somaram US$ 7,3 bilhões, ante US$ 1 milhão em igual período de 2017. A importação nesse período nunca chegou sequer a US$ 1 bilhão na série histórica desde 1997.

O desempenho distorce as importações, número que serve como indicador da demanda doméstica. Sem as plataformO desempenho distorce as importações, número que serve como indicador da demanda doméstica. Sem as plataformas, as importações cresceram 15,8% no acumulado até agosto, e não 23% considerando os desembarques gerais pela média diária.

Nos bens de capital, grupo no qual são classificados esses equipamentos, a retirada das plataformas reduz de 94,5% para 22,2% o crescimento das importações na mesma comparação.

"Olhando os números totais de importação de bens de capital, parece que há grande nível de investimentos e de confiança das empresas, mas isso não é o que acontece", diz José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).

No lado das exportações, há também marca histórica. Foram US$ 4,08 bilhões no acumulado até agosto, ante US$ 903 milhões no mesmo período de 2017. Com o desempenho, a plataforma tornou-se o item mais importante da pauta brasileira de exportação de manufaturados, seguida pelos automóveis, que somaram US$ 3,9 bilhões em iguais meses. Como resultado líquido de exportações e importações, a balança das plataformas gerou, portanto, déficit de US$ 3,25 bilhões nos oito primeiros meses do ano.

O que explica o maior volume de plataformas tanto nos embarques quanto nos desembarques, na verdade, não são operações novas, mas sim um período de transição de antigas regras do Repetro, regime especial para o setor de petróleo. Regulado anteriormente com base em decreto de 2009, o regime foi alterado por lei de 2017 e passou a se chamar Repetro Sped. As novas regras foram regulamentadas por instrução normativa da Receita de janeiro deste ano.

Antes da mudança, o Repetro desonerava de tributos federais bens destinados à indústria de óleo e gás, mas não permitia que eles fossem incorporados ao estoque de investimentos do país. Ou seja, o benefício tributário não era concedido nas importações definitivas. "Uma plataforma importada por US$ 1 bilhão geraria US$ 600 milhões em tributos, fora o ICMS", diz Carolina Bottino, do Taiul e Chequer Advogados.

Por isso, máquinas e equipamentos fabricados no Brasil no âmbito do Repetro eram vendidos a alguma empresa no exterior, como exportação, mesmo quando não houvesse saída física dos bens do território nacional. É a chamada exportação com saída ficta. Os mesmos bem eram declarados depois como "admissão temporária", diz Carolina. Essas operações não são contabilizadas na balança comercial, já que a propriedade das plataformas continuava de empresa estrangeira, sem sua incorporação à economia nacional.

Nas novas regras do Repetro Sped, é concedido benefício tributário na aquisição no mercado interno ou na importação para permanência definitiva de bens destinados à atividade de exploração e desenvolvimento de campo de petróleo ou de gás natural. O Repetro antigo deve valer até o fim de 2019. Até lá, porém, as operações comerciais com equipamentos para exploração de petróleo passam por um período de transição para o chamado Repetro Sped.

Com isso, operadores que tenham objetivo de efetivamente adquirir equipamentos que serão utilizados a longo prazo, o que costuma ser o caso das plataformas, tendem a usar a operação de importação, e não mais a aquisição temporária, explica Rodrigo Brunelli, sócio do escritório Ulhoa Canto Advogados.

Um dos efeitos do período de transição entre os dois programas é a internalização de plataformas que já haviam sido encomendadas antes do Repetro Sped. De acordo com técnicos do Mdic, todos os US$ 4,08 bilhões em exportações de plataformas neste ano referem-se a encomendas feitas antes da vigência do Repetro Sped. Por isso a produção dessas plataformas usou o regime de drawback. Neste incentivo, os estaleiros adquirem insumos com suspensão de tributos, mas o benefício só vale se houver a exportação do produto final.

No caso, foram três plataformas que geraram exportações com saída ficta para que os estaleiros conseguissem completar o ciclo do benefício do drawback. As três plataformas exportadas foram depois importadas. No Repetro antigo, diz o técnico do Mdic, o mais provável é que fossem declaradas como admissão temporária. Agora, com o Repetro Sped e a garantia da suspensão de tributos na compra do exterior de bens destinados à exploração de petróleo, as três plataformas foram declaradas como importação. Os valores de importação são maiores que os de exportação, já que houve complementação posterior de equipamentos que elevaram o valor das plataformas exportadas.

Essas três equipamentos, juntamente com uma quarta plataforma, somam os US$ 7,3 bilhões importados no ano. Deste valor, US$ 3,6 bilhões foram originados do Brasil. A quarta plataforma, de US$ 1,6 bilhão, foi uma operação efetiva de importação.

Outro efeito que ainda pode ter reflexo na balança comercial, explicam técnicos do Mdic, são as plataformas que geraram exportações com saída ficta antes de 2018 e que podem eventualmente ser alvo de importação por seus operadores. Isso, segundo o Mdic, resultará em aumento no montante de importações brasileiras até o final de 2019, a ocorrer de acordo com o cronograma de nacionalização desses bens pelas companhias do setor. O impacto estimado para 2018 é de R$ 32 bilhões.

Passados os efeitos do período de transição, a tendência é que com a nova legislação, segundo Brunelli, as operações sejam declaradas de forma mais fiel à sua natureza econômica (exportações, importações ou aquisições temporárias). Técnicos do Mdic lembram que, findo o período de transição, as plataformas deixarão de passar pela de passar pela contabilidade do comércio exterior, já que serão simples operações de compra e venda internas, sem alteração de propriedade para pessoas jurídicas estrangeiras.


Fonte: Valor













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