Mudança regulatória atrai sete empresas aéreas estrangeiras




Em setembro do ano passado, a chilena Sky Airline foi a primeira empresa estrangeira de baixo custo (low cost) a pedir autorização à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) para operar voos internacionais no Brasil. Desde então, mais quatro empresas low cost anunciaram a oferta de voos regulares no país - Norwegian, Flybondi, Virgin Atlantic e JetSmart. Além dessas, duas companhias aéreas regulares anunciaram intenção de vir para cá, a Air China e a Gulf Air.

O interesse crescente de empresas aéreas estrangeiras no Brasil, principalmente as low cost, é consequência de duas mudanças recentes. Uma delas foi a aprovação da medida provisória, convertida em lei neste ano, que eliminou o antigo limite de 20% de capital estrangeiro em companhias aéreas. Outra mudança foi a implantação, desde março de 2017, da Resolução 400 da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), que acabou com o despacho gratuito de bagagens de até 23 quilos. Essa regra ainda está em discussão no Congresso.

“A abertura do mercado ao capital estrangeiro foi o principal fator de atração para as empresas estrangeiras. O fim da franquia de bagagem atrai as empresas low cost. Mas há mais a ser feito para fomentar a competição no país”, afirmou Juliano Alcântara Noman, diretor da Anac.

Na visão do executivo, o que falta para o mercado aéreo brasileiro dar um salto é atingir a parcela da população com menos renda. “Isso só é possível vendendo passagem aérea por menos de R$ 100 por trecho. Para isso, o custo da operação precisa ser mais baixo”, afirmou Noman.

O diretor citou como fator de estímulo para atrair novos competidores ao país a redução nos custos com o querosene de aviação, insumo que representa entre 35% e 40% do custo operacional de uma companhia aérea.

Eduardo Sanovicz, presidente da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), disse que a associação discute com governos dos Estados a redução da alíquota de ICMS sobre o querosene de aviação. A Abear representa Gol, Latam, Latam Cargo, Avianca Brasil, Boeing, MAP, Passaredo e Twoflex. Atualmente, as alíquotas cobradas nos Estados variam de 3% a 25%. “O custo do combustível no Brasil chega a ser 40% mais caro do que nos Estados Unidos, devido à tributação”, observou Sanovicz.

O diretor da Anac também defendeu a simplificação dos processos de autorização para que companhias aéreas estrangeiras comecem a operar no Brasil.

“Hoje, o processo de certificação da empresa aérea gira em torno de um ano. É razoável pensar que uma empresa habilitada na Europa, por exemplo, tenha condições de operar com segurança no Brasil. Precisamos simplificar os processos para liberar mais rápido essas autorizações, preservando as exigências de segurança”, afirmou Noman.

Por enquanto, a maioria das empresas estrangeiras que pediram autorização têm como objetivo oferecer voos internacionais.

Ontem, a JetSmart anunciou o início de seus voos no Brasil em 27 de dezembro. A companhia, que pertence ao fundo americano Indigo Partners, terá voos ligando Salvador a Santiago, no Chile. Em 5 de janeiro de 2020, a companhia começa a operar dois voos semanais entre Foz do Iguaçu (PR) e Santiago. A rota entre São Paulo e a capital chilena estreia em 20 de março de 2020, com dois voos semanais.

A Sky Airlines oferece desde novembro de 2018 voos de Santiago do Chile a Guarulhos (SP) e ao Rio de Janeiro. No fim deste ano, vai oferecer também voos de Santiago a Florianópolis e a Salvador.

A Air China passou a oferecer em março deste ano dois voos semanais na rota Guarulhos-Madri-Beijing. A europeia Norwegian opera desde maio deste ano a rota Londres-Rio de Janeiro. A argentina FlyBondi começa a voar a partir de 11 de outubro, com rotas que ligam a cidade El Palomar, na Argentina, a Guarulhos e Rio de Janeiro. A partir de 20 de dezembro, fará também a rota El Palomar-Florianópolis. A Virgin começa a oferecer em março de 2020 voos diários ligando Londres a Guarulhos e ao Rio de Janeiro.

Apenas a Air Europa, que pertence à Globalia, está se organizando para obter o certificado de operador aéreo (COA) para oferecer voos domésticos no Brasil, competindo diretamente com empresas nacionais como Gol, Latam e Azul.

A Gulf Air, do Bahrein, teve conversas com o Ministério do Turismo em julho, demonstrando interesse em competir no país com voos domésticos. Mas, de acordo com Noman, a empresa ainda não fez consulta à Anac para obter autorização para atuar no Brasil.

Estuardo Ortiz, fundador e presidente-executivo da JetSmart, também disse que a companhia low cost chilena avalia oferecer voos domésticos no Brasil no futuro. “No momento, lançamos voos internacionais, mas o mercado brasileiro tem muito potencial. Nos interessa no futuro ter operação doméstica no país”, afirmou Ortiz. Com os três voos anunciados ontem, a companhia espera transportar 100 mil passageiros no primeiro ano de atuação no Brasil.

A JetSmart opera hoje com uma frota de 11 aviões, mas tem encomenda para receber 104 aeronaves da Airbus até 2021, com investimento total de US$ 11,4 bilhões. Ortiz disse que receberá seis aviões Airbus A320 até 2020, fruto de um investimento de US$ 660 milhões. Desse total, dois chegam nas próximas duas semanas e serão usados para a operação no Brasil.

Ortiz disse que a JetSmart pretende liderar o mercado aéreo low cost na América do Sul até 2026. Atualmente, a empresa tem operações no Chile, na Argentina e no Peru. Um reforço na operação brasileira, segundo Ortiz, vai depender das condições do mercado.

Para o diretor da Anac, o aumento da competição em voos domésticos vai depender de mudanças nas regras de distribuição de horários de pousos e decolagens (“slots”) em aeroportos mais concorridos, como o de Congonhas. “A norma como está hoje acaba proporcionando um domínio das maiores empresas. É preciso dar mais espaço para novos competidores. É justo que quem desenvolveu o mercado fique com uma fatia, mas é fundamental dar acesso a novos entrantes”, afirmou.

Noman também observou que as regras atuais não preveem, por exemplo, a distribuição de slots com base no tamanho dos aviões, para otimizar a divisão. A fase de revisão das normas, segundo o executivo, deve durar pelo menos até meados de 2020.

Sanovicz disse que as empresas aéreas associadas da Abear são favoráveis à abertura do mercado, desde que as mudanças acompanhem as tendências do mercado internacional.

O presidente da Abear também cita como desafios do mercado brasileiro os custos trabalhistas e o alto grau de judicialização do setor no país. “Uma empresa americana que tem 2 mil voos diários nos EUA enfrenta 18 processos judiciais lá. Essa mesma empresa, com seis voos diários no Brasil, tem quase 300 processos judiciais. Tudo isso representa custo para operar no país e dificulta a entrada de novos concorrentes, principalmente as low cost”, afirmou Sanovicz.



Fonte: Valor

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