Há
poucas coisas tão maçantes como uma sessão no plenário do Senado. Mesmo com o
recinto lotado, como na última quarta-feira. Ali, além do nobre Demóstenes Torres
(ex-DEM-GO), tinha mais. Discursos dramáticos como o do tucano Mário Couto (PA)
— xingando os petistas — e até emotivos, como o do petista Eduardo Suplicy (SP),
preocupado com a voz da ex-mulher, Marta, que comandava os trabalhos e àquela
altura estava afônica. Aquela noite, entretanto, foi especial. Um projeto
histórico foi aprovado. A
sessão de 9 de maio acabou com os 14º e 15º salários dos parlamentares. Antes
das comemorações, um pouco da história da picaretagem. Os extras foram institucionalizados
em 1995 para bancar os gastos com a mudança de políticos recém-eleitos para
Brasília, como se os camaradas fossem de fato morar aqui, e não nos estados de
origem. A partir da lógica torta dos beneficiados, o 14º pagaria a chegada ao
Congresso. O 15º, por sua vez, serviria para cobrir o custo da volta, no fim do
mandato, quando o parlamentar fosse defenestrado pelo eleitor ou assumisse cargo
no estado natal. Mesmo assim, a justificativa de araque só seria razoável se os
ilustres deputados e senadores desejassem de fato passar o período do mandato em
Brasília, e não apenas as terças, as quartas e as quintas. O absurdo,
entretanto, é ainda maior. Os nossos políticos decidiram incorporar o benefício
ao contracheque. Todos os anos, como se fizessem uma mudança a cada 12 meses
para o estado de origem. Do Congresso, a prática estúpida com o dinheiro do contribuinte
se espalhou por assembléias estaduais e câmaras municipais, incluindo a casa
onde habitam os nossos nobres deputados distritais.
Dificuldades
Pois
bem, na noite da última quarta-feira algo começou a mudar no Congresso. Os senadores
derrubaram, por unanimidade, os salários extras, depois da votação da Lei Geral
da Copa, do discurso irado de Mário Couto e da intervenção cuidadosa de Suplicy.
Foi o primeiro e decisivo passo para aprovar um projeto apresentado ainda no ano
passado pela hoje ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, que acaba com
a estupidez. Um ponto: ainda falta a tramitação na Câmara dos Deputados. Apesar
do otimismo da vice-presidente da Casa, Rose de Freitas (PMDB-ES) — “é um projeto
com forte apelo popular, dificilmente enfrentará resistência” — , os líderes do
PMDB e do PT ouvidos pela reportagem do Correio deixaram claro o desconforto em
tratar do assunto na Câmara. O peemedebista Henrique Eduardo Alves e o petista
Jilmar Tatto, depois de desconversarem, disseram que não discutiram o tema com
as bancadas. E, assim, jogaram um balde de água fria na expectativa de o
projeto ser aprovado com rapidez. “Estávamos tratando de outros temas”, disse
Tatto. É preciso que seja dito que os benefícios extras dos senadores e
deputados — e por tabela dos distritais, estaduais e vereadores — são
esdrúxulos para qualquer cidadão brasileiro, que, no máximo recebe 13 salários
por ano. Por mais que amparado nas regras do Congresso, é um acinte, afinal, na
prática que os paga é o trabalhador que não os recebe. É o seu dinheiro, meu
caro leitor, que enche o bolso dos camaradas duas vezes por ano. Se há bons combates
para a sociedade, o fim dos rendimentos extras dos congressistas é um dos
principais. Abaixo os 14º e 15º salários de uma vez por todas.
Outra coisa
A
aprovação do fim do 14º e do 15º salários no Senado foi celebrado pelos
repórteres deste Correio, que desde a derrubada do benefício na Câmara
Legislativa, ainda em fevereiro, pautou o tema numa série de reportagens. Uma das
mais significativas: a revelação de que os senadores não pagavam o Imposto de
Renda dos rendimentos extras recebidos. No fim da sessão da última quarta-feira,
Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) — ao cumprimentar a Presidência do Senado por ter
colocado o projeto na pauta —, destacou: “Parabenizo o Correio, um jornal da
nossa cidade, por ter levantado e discutido essa bandeira”. O trabalho de
reportagem continuará durante a tramitação do projeto na Câmara dos Deputados.
Fonte:JC
Nenhum comentário:
Postar um comentário