O
governo se depara com um emaranhado de desafios depois de três anos de
crescimento frustrante, e inflação próxima ao teto da meta e num momento em que
as famílias, que estão com 45% da renda anual comprometida (maior nível da
história), podem ser atropeladas pelo aumento dos juros básicos (Selic). A esse
cenário, soma-se ainda a disparada do dólar, com potencial para piorar o custo de
vida e estrangular o caixa da Petrobras, o que pode levar a reajustes de
combustíveis ou até atrapalhar os investimentos no pré-sal. Desde os anos da
hiperinflação, um governo não encontrava um cenário econômico tão hostil,
ampliado pelos maiores protestos da história do país, que podem se repetir em
2014. Desatar todos esse nós vai exigir que o governo se desdobre em diálogos com
agentes políticos e participantes do mercado financeiro. A condução da
economia, no entanto, até agora, segue mergulhada em descrença. “Do lado
fiscal, confesso que já joguei a toalha. Pouco provável que haja uma evolução. O
próprio Guido Mantega (ministro da Fazenda) declarou que a política fiscal é
neutra quando o BC insiste que é expansionista”, observou Alexandre Póvoa,
economista chefe da Canepa Asset. “Eles não falam a mesma língua em relação a
isso”, criticou. A desconfiança levou a uma saída de capital estrangeiro do País.
A BlackRock, maior gestora de recursos do mundo, reduziu sua participação em
três empresas brasileiras: Hering, Usiminas e CCR. Ontem, mesmo depois de o BC
desaguar US$ 4 bilhões no mercado, o dólar subiu mais 0,83% e fechou o dia R$
2,416 na venda. No ano, a instituição fez quase 60 intervenções com volume financeiro
de R$53,8 bilhões. Os títulos do governo brasileiro sofreram com esse cenário e
o Tesouro foi obrigado a intervir no mercado em duas operações de recompra que somaram
R$ 1,6 bilhão. Com a escalada do dólar, o mercado começa a refazer para cima as
previsões em torno da alta de juros (Selic) até o fim de 2013. A aposta é que o
Comitê de Política Monetária (Copom) eleve a taxa básica de juros em 0,50 ponto
percentual na próxima semana, dos atuais 8,5% para 9% ao ano. Com a medida, a
instituição tentaria minimizar o impacto da alta do dólar sobre o real na
inflação. Se a elevação da divisa for mantida, pode haver impacto de mais de 1 ponto
percentual no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial. Ontem
à tarde, 40% dos investidores no mercado futuro já apostavam em um aumento da
Selic, até o fim de 2013, para um nível de até 10% ao ano. “Ficou claro, nas
últimas tentativas, que as intervenções feitas pelo BC no mercado de câmbio
perderam eficácia. A combinação de dólar alto e inflação vai jogar os juros para
cima, não há alternativa”, argumentou Eduardo Velho, economista-chefe da Invx Global
Partners. Para Luis Otavio de Souza Leal, economista-chefe do ABC Brasil, “o
câmbio virou o grande termômetro para os juros”. “Por isso, não vejo motivo para
o BC paralisar o aumento da Selic”, disse. Póvoa, da Canepa, acha que há um
limite. “Levar a dois dígitos causaria um barulho político enorme e acho que o
BC não tem mandato para isso”, disse. Nesse cenário, as projeções para o PIB de
2013 e de 2014 se mostram mais cautelosas. “Vamos ter atividade mais fraca. Isso
vai ter impacto no emprego”, frisa Póvoa.
Endividamento se torna
preocupação
A
sensação de insegurança está cada vez maior entre os agentes econômicos. Dados dos
BC mostram que quase 45% da renda dos lares brasileiros estão comprometidos com
empréstimos e financiamentos. “Há muito tempo não vemos essa combinação, de juros
e sinais de desemprego”, admitiu um integrante da equipe econômica. “Estamos acompanhando
todos os dados com lupa”, emendou. No entender dos especialistas, o que mais
assusta é falta de uma sinalização mais clara e unficada do Banco Central e da
Fazenda sobre o que será feito para desatar os nós criados pela política
econômica. Para Luciano Rostagno, estrategista-chefe do banco Mizuho, a
proximidade das eleições e o impacto dos problemas econômicos sobre a
popularidade da presidente Dilma Rousseff pode levar o governo a uma mudança de
sinalização. “Há a perspectiva de que o governo faça um ajuste para
restabelecer a confiança até o ano que vem”, observou. “As eleições já estão
influenciando a política fiscal. O mercado, no entanto ainda não colocou no
preço a possibilidade da Dilma perder”.
Fonte: JC
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