Tempestade
perfeita é uma expressão meteorológica que a economia tomou emprestada para
definir uma coincidência de eventos que formam uma crise. O Brasil está assim
na área de combustíveis. O consumo foi incentivado pelo subsídio ao automóvel e
à gasolina, a importação cresceu, gerou um déficit, o dólar subiu, a Petrobras
pede aumento, mas a inflação está alta. Tudo o que podia ser feito de errado
foi feito, e tudo o que podia dar errado deu. E os problemas se juntaram em um
nó cego. O governo incentivou a compra de carros com reduções de IPI, para
aumentar o crescimento econômico. Não conseguiu o que queria, mas multiplicou
os carros nas ruas, entupindo o trânsito e tornando a mobilidade urbana
desesperadora. Como a inflação tem estado alta, o governo postergou o aumento
da gasolina. O consumo aumentou e a Petrobras teve que importar mais. O custo
não foi repassado aos preços e isso incentivou mais o consumo. O subsídio à
gasolina tirou consumidores do etanol e aumentou o custo da Petrobras. O
governo tentou aliviar o peso da estatal eliminando devagar o imposto sobre a
gasolina, a Cide. Ela foi criada para ser um amortecedor da volatilidade do
preço do petróleo ou do dólar. Funcionava assim: quando o custo subia
bruscamente, a Petrobras passava a receber mais, e o Tesouro recebia uma
parcela menor do imposto pago pelos consumidores. Assim, a Petrobras ganhava,
na prática, um aumento, mas o consumidor não tinha que pagar mais. Foi pensado
para ser um colchão, mas virou uma forma de adiar o reajuste. A Cide foi sendo
reduzida desde 2008 até ser eliminada da gasolina. Quando a mágica acabou, o
governo autorizou um aumento do combustível. O fim da Cide tirou uma fonte de
financiamento de obras da infraestrutura de transportes. Uma conta publicada
aqui tempos atrás, feita por Adriano Pires, indica que o governo perdeu R$ 22
bilhões de 2008 até a eliminação do imposto. Agora, os prefeitos pedem a volta
da Cide para ajudar a financiar o sistema de transporte público. A tempestade
continuou. O aumento da importação da gasolina foi tão alto que o governo
autorizou a Petrobras a deixar para 2013 o registro de parte da importação, mas
a importação continuou aumentando e chegou a 250 mil barris/dia no primeiro
trimestre. Foi assim que se chegou a um déficit de US$ 15 bilhões na conta de
importação e exportação de petróleo e derivados este ano. Enquanto isso, nos
Estados Unidos, o Fed anunciou que pode encerrar o período de expansionismo
monetário. O aviso prévio elevou a cotação do dólar no mundo inteiro. Com a
alta da moeda americana, o custo de importação de combustíveis subiu e, por
isso, a Petrobras está agora pedindo novo aumento. Alega que teve que aumentar
seu endividamento para cobrir investimentos e corre o risco de ultrapassar o
limite da relação entre dívida líquida e geração de caixa. O governo não quer
corrigir os combustíveis, mas não pode descapitalizar a Petrobras até porque
ela terá, no modelo de partilha do pré-sal, que ser a operadora de todos os
campos e tem outros pesados investimentos sendo feitos. Em resumo, o governo
conseguiu até agora subsidiar o uso de um combustível fóssil importado,
desorganizar a produção local da alternativa menos poluente, aumentar a
dependência do petróleo externo depois de proclamar a autossuficiência, abrir
mão de um imposto que financiaria obras de infraestrutura de transportes,
causar perdas à Petrobras, abrir um rombo na balança comercial, alimentar a
desconfiança das empresas sobre o intervencionismo do governo na economia,
piorar o trânsito nas cidades e deixar todo mundo insatisfeito.
Fonte: O Globo
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