Punição a quem perde prazo chega a ser sete vezes maior que nos
EUA, mostra estudo da consultoria EY.
Os
brasileiros que deixam para enviar a declaração de Imposto de Renda (IR) na
última hora e acabam perdendo o prazo de entrega - o deste ano, referente ao
calendário de 2013, se encerra na quarta-feira, dia 30, às 23h59m - podem ser
alvo de pesadas multas da Receita Federal, dependendo do imposto devido. São
punições que superam inclusive as aplicadas por outros países a seus
contribuintes. Um levantamento da consultoria EY (antiga Ernst & Young) com
base nas regras de nove países, feito a pedido do GLOBO, mostra que, dependendo
do valor devido, a multa máxima cobrada pelo Leão chega a ser o dobro da
praticada pelo Fisco da Argentina, quatro vezes maior que na Rússia e sete
vezes superior ao cobrado nos Estados Unidos, considerando o teto das
cobranças. De acordo com a Receita Federal, 10,8 milhões de pessoas ainda não
tinham feito a declaração até a sexta-feira passada, de um total de 27 milhões
de entregas esperadas para este ano. Muitos brasileiros devem acertar as contas
com o Fisco neste fim de semana. Quem perder o prazo terá que pagar multa
mensal de 1% sobre o imposto devido ao longo do ano passado — o que não deve
ser confundido com o eventual imposto a mais a pagar apurado na entrega da
declaração. Esta cobrança é de, no mínimo, R$ 165,74 e pode chegar a 20% do
imposto devido. Para comparar os países, que têm diferentes regras, a EY
simulou qual seria a multa aplicada a um contribuinte com rendimento tributável
de R$ 86 mil no ano passado, que tenha imposto devido de R$ 10 mil e já tenha
sofrido recolhimento de R$ 9 mil na fonte. Este declarante teria a pagar mais
R$ 1 mil de imposto para a Receita em sua Declaração de Ajuste Anual. - A multa
pode ser pesada. O problema é que aqui no Brasil, quando o contribuinte atrasa
a entrega, ele paga a multa mensal sobre os R$ 10 mil de imposto devido do ano
anterior, e não sobre o R$ 1 mil que ele tem a mais a pagar, como é nos EUA,
por exemplo. Quanto maior for o atraso e maior for o imposto devido, pior a
situação - explica o gerente sênior de Capital Humano da EY, Leandro Souza. - É
algo que se deveria, inclusive, questionar: por que pagar multa sobre um
imposto que já recolhi mensalmente na fonte? Pela simulação, que considera a
paridade do poder de compra de cada país, o contribuinte brasileiro que atrasar
a entrega do IR paga multa de US$ 89,06 (um mês de atraso) a US$ 1.074,73 (pelo
teto de 20% do imposto devido). O valor variaria de US$ 268,68 a US$ 537,37 na
Argentina, por exemplo. Nos Estados Unidos, seria de US$ 134,34. Na França, o
valor seria ainda menor, de US$ 53,74. O levantamento mostra que alguns outros
países, contudo, podem ser mais duros com seus contribuintes. É o caso de Portugal
(multa de US$ 31,04 a US$ 6.207,54), Holanda (de US$ 273,65 a US$ 5.957,27) e
também da Itália (de US$ 342,48 a US$ 1.289,68).
Falta de documentação é
principal motivo de atraso
Carlos
Alberto Silva de Lima, consultor sênior da área de imposto da consultoria
Cenofisco, diz que os atrasos no acerto de contas com o Fisco são comuns entre
clientes, apesar dos alertas frequentes para organizarem a papelada com
antecedência. Ele explica que muitos perdem o prazo principalmente por não
terem a documentação necessária para fazer a entrega, como o informe de
rendimentos do empregador ou da previdência social, além de registros de venda
de bens, como imóveis. - Em alguns casos, os clientes acabam entregando a
declaração mesmo sem todas as informações para evitar a multa. Depois, fazem a
retificação. Isso pode valer a pena em muitos casos. Só é preciso tomar cuidado
para não ter, por exemplo, variação muito grande de patrimônio na retificação.
Neste caso, se chamar atenção e cair na malha fina, a Receita pode arbitrar
multa de até 150% do imposto devido. E, se tem uma coisa que funciona neste
país, é o cruzamento de dados da Receita - afirma. A aposentada Lurdes Saccardo
corre contra o relógio para entregar sua declaração de IR. Ela conta que
conseguiu reunir a própria papelada com antecedência, mas acabou esbarrando em
dificuldades encontradas por seu marido. Ele identificou uma diferença no
rendimento informado por sua ex-empresa e os números que possui. - Entregamos
as declarações de Imposto de Renda separadas, mas as informações do cônjuge
precisam constar na declaração dos dois. O problema está nos detalhes mínimos,
que podem virar dor de cabeça. No ano passado, entreguei aos 48 do segundo
tempo. Este ano, até agora, não foi muito diferente, mas acredito que não vou
perder o prazo - disse a aposentada, que recorre frequentemente ao contador do
filho para esclarecer dúvidas. Especialistas lembram que a multa por atraso
vale mesmo para quem tem imposto a receber de volta do Leão. Um contribuinte
com direito a uma restituição de R$ 500 pode acabar devendo R$ 50 ao Fisco se
atrasar a entrega em apenas dois meses. Neste caso, a simulação leva em conta
um contribuinte que tenha R$ 27.500 de imposto devido, mas que contribuiu com
R$ 28 mil ao longo do ano. Se o acerto de contas for feito com dois meses de
atraso, a multa da Receita Federal chega a R$ 550. Já quem não teve rendimentos
tributáveis, mas precisou apresentar a declaração por ter bens acima de R$ 300
mil, pagará o mínimo de R$ 165,74 se atrasar o acerto de contas. Em caso de
perda de prazo, o declarante recebe uma notificação de lançamento de multa
assim que faz a transmissão pelo programa da Receita. Essa notificação precisa
ser impressa e paga em 45 dias a partir da entrega em atraso, segundo
informações da Receita Federal. Segundo o levantamento da EY, ao menos seis
países permitem ao contribuinte estender o prazo de entrega da declaração:
Alemanha, Austrália, Estados Unidos, França, Holanda e Suécia. No caso dos EUA,
o prazo original de entrega é 15 de abril, podendo ser estendido até 15 de
dezembro. Isso é permitido, por exemplo, a um contribuinte que esteja no
exterior e possa comprová-lo. Neste caso, o imposto precisaria ser pago
antecipadamente, e erros no cálculo podem ser motivos de pesadas multas. Restituição
com tratamento diferente O advogado tributarista Rubens Branco, da Branco
Consultores, explica que os países consideram muitas vezes a entrega da
declaração de ajusta anual como algo “acessório”, já que a maior parte da
contribuição foi feita ao longo do ano, com impostos retidos na fonte. Isso
seria diferente no caso brasileiro. - A Receita se preparou muito bem para
obter as informações dos contribuintes, com tecnologias de ponta para
cruzamento de informações e isso está certo. Mas não queira precisar esclarecer
alguma coisa para a Receita. Vai levar anos - disse Branco. O levantamento
mostra que em alguns casos o imposto devido pelo ajuste anual é pago após a
análise do Fisco. No Brasil, o imposto é pago antes da malha fina. E, caso o
cálculo esteja incorreto, o contribuinte terá que pagar multa relativa ao
período. Se a conta estiver certa, é preciso aguardar a análise da Receita para
receber a diferença. Na Holanda, o contribuinte recebe uma comunicação sobre a
existência de imposto a pagar após a análise do Fisco local e tem até 60 dias
para quitar o valor. Na França, o imposto é pago apenas no ano seguinte e
calculado pelo Fisco francês com base na declaração do ano anterior. Na
Austrália, ocorre o mesmo. Quem tem imposto a receber também é tratado de forma
diferente em outros países. Na Suécia, após o processamento da declaração, o
contribuinte recebe comunicação informando se haverá restituição, que passa a
ficar imediatamente disponível. Na Austrália, quando existe imposto a receber
de volta, o contribuinte não costuma ser multado por atraso na entrega.
Procurada, a Receita Federal não comentou o levantamento.
Fonte:
O Globo
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