Segundo o Fundo,
país pode ser duramente afetado por retirada de estímulos em nações ricas e por
baixo crescimento.
O Fundo Monetário Internacional (FMI)
considera o Brasil uma das cinco economias emergentes mais vulneráveis do mundo
atualmente, em situação frágil para enfrentar uma possível deterioração das
condições globais. O país seria afetado de forma dura se o processo de
normalização das políticas monetárias das nações ricas — retirada de estímulos
e aumento dos juros — for acidentado e se os próprios emergentes continuarem
crescendo abaixo do esperado, como ocorre há três anos. Combinados, esses
fatores podem gerar turbulências, limitar e encarecer o acesso a recursos,
derrubar as commodities que alimentam as exportações, aumentar dívidas e travar
investimentos, reduzindo ainda mais a projeção de expansão do Produto Interno
Bruto (PIB) brasileiro, de apenas 2% em 2015. Fazem companhia ao Brasil no
grupo preocupante, listado no relatório anual de avaliação de efeitos
colaterais (spillover) do FMI, divulgado nesta terça-feira, Índia, Turquia,
Indonésia e África do Sul. No caso de novo furacão financeiro, essas nações arcariam
com a maior elevação dos juros dos títulos soberanos e privados, a queda mais
acentuada dos preços de ativos em seus mercados (como ações na Bolsa) e a
desvalorização cambial mais robusta. O grupo dos “Cinco Frágeis” foi citado
pela primeira vez em agosto do ano passado, em relatório do banco americano
Morgan Stanley, que teve grande repercussão. O texto afirmava que esses países
seriam os mais vulneráveis à instabilidade da economia global, sobretudo à
retirada dos estímulos à economia dos EUA. Os cinco países já tiveram um ensaio
do tipo de agruras por que podem passar, após os EUA indicarem que começariam a
retirar os estímulos à economia americana, em maio do ano passado. Nos sete
meses seguintes, os cinco emergentes sofreram reversão de expectativas, fuga de
capitais e perda de valor da moeda frente ao dólar, acentuando problemas
domésticos. A ação do Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA) começou
efetivamente em novembro. Até outubro deste ano, o Fed vai acabar com o
programa de compra de títulos. Os mercados, então, começarão a antecipar quando
ocorrerá a primeira alta de juros, próximos a zero desde 2008, atraindo de
volta os capitais que inundaram os emergentes entre 2009 e 2012. O FMI, no
trabalho coordenado pelo economista Hamid Faruqee, acredita que as maiores
chances são que a mudança monetária dos ricos ocorra de forma ordenada. Mas
reconhece que os BCs de EUA, Inglaterra, Europa e Japão enfrentam situação
inédita e desafiadora e que não é possível descartar dificuldades, como turbulências
nos mercados a partir de sinais trocados de comunicação, subidas dos juros
antes do previsto e em maior intensidade do que a esperada. Ao mesmo tempo, o
Fundo avalia que os países emergentes — Brasil incluído — passam por
desaceleração do crescimento consistente, gradual e prolongada, que sugere
deficiências estruturais arraigadas. Até 2018, estas nações terão expansão
abaixo do potencial, como resultado de ganhos residuais ou mesmo perdas, como
na América Latina, de produtividade nos anos recentes. Hamid Faruqee explica
que este cenário pode alimentar ainda mais o mau humor dos investidores,
tornando as turbulências mais graves e reduzindo ainda mais o crescimento. Ou
seja, arrisca-se um círculo vicioso. Os emergentes, como o Brasil, teriam muito
a perder. Mas também os países ricos, por intermédio de comércio global mais
fraco, menos receitas de multinacionais e bancos, que têm no mundo em
desenvolvimento um de seus principais filões, e possíveis esqueletos da crise
financeira hoje mascarados. — É difícil atribuir probabilidade, mas o fato é
que existe o risco de o pior cenário se materializar. No cenário mais adverso,
os emergentes desapontariam, nos próximos três anos, crescendo 0,5 ponto
percentual menos anualmente. Nos últimos três anos, as projeções foram cortadas
sistematicamente. Além disso, tivemos os problemas de maio do ano passado, que
foram amostra do desafio de os ricos saírem da atual política monetária —
advertiu Faruqee. No caso do Brasil, o ritmo anêmico da economia, diz o FMI,
está relacionado a baixas taxas de investimento e poupança doméstica. O país,
segundo a equipe econômica, está atualmente em recessão. E não crescerá mais do
que 1,3% em 2014, pelos números do Fundo. A saída é resolver gargalos de
infraestrutura, especialmente nos setores elétrico e de transporte, aumentar a
eficiência do investimento público, adotar medidas que elevem
competitividade,reanimar a confiança dos investidores e desestimular o consumo
como âncora da expansão. Isso passa por um dever de casa mais amplo. Começa com
a redução do rombo nas contas públicas, com um ajuste fiscal, e passa pela
reconstrução dos amortecedores regulatórios. E se estende a dois outros
pontos-chave: derrubar a inflação alta e diminuir a necessidade de
financiamento externo (expressa pelo déficit em conta corrente). Sem melhorar
essas condições, afirma o FMI, o espaço de manobra para reação em caso de nova
crise estará muito limitado. Em outro relatório, de avaliação do setor externo,
o FMI considera que o déficit em conta corrente do Brasil, em 3,6% do PIB (ou
2,9%, com dados ajustados), está “moderadamente” acima do que seria
aconselhável. Para o Fundo, o ideal é um número entre 1% e 2,5% do PIB. — Não
há nenhum senso de alarme na avaliação do Brasil, de forma geral ela é a de que
o número está moderadamente acima do que deveria. Não é que não haja questões a
se observar, mas eu colocaria a ênfase no moderadamente — afirmou o economista
Steven Phillips, que coordenou o estudo, que mostra que o real ainda está muito
valorizado. As escolhas do governo brasileiro terão impacto direto no Cone Sul.
Ao lado de China, Rússia e Venezuela, o Brasil é a nação em desenvolvimento que
mais pode contaminar negativamente os vizinhos em caso de desaceleração mais
acentuada do crescimento, segundo o FMI. Estão no radar de influência
brasileira os parceiros de Mercosul _ Argentina, Uruguai e Paraguai _ e a
Bolívia. A economia paraguaia arcaria com o maior custo. Expansão 1 ponto
percentual menor no Brasil em 2015 poderia diminuir o PIB do Paraguai em 0,9
ponto. “Os acordos regionais de comércio têm contribuído para o fortalecimento
dos laços comerciais entre o Brasil e os países do Cone Sul. Considerando seu
tamanho, o Brasil tornou-se um grande consumidor de bens produzidos pelos seus
vizinhos. Esses países, portanto, estão vulneráveis a uma desaceleração no
Brasil”, diz o relatório de efeitos colaterais do FMI.
Fonte:
O Globo
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