Na economia brasileira, as microempresas (ME)
e as empresas de pequeno porte (EPP) têm relevante papel no crescimento econômico,
uma vez que são responsáveis por uma parcela considerável do PIB (Produto Interno
Bruto) brasileiro. Diante de tal importância, foi promulgada a Lei Complementar
123, de 14/12/2006 (Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno
Porte), que em atendimento ao art. 179 da Constituição da República de 1988 –
que trata de um dos princípios gerais da economia – estabeleceu o valor do
faturamento como critério para definir quem são as ME e EPP e a simplificação
do procedimento para registro e o regime previdenciário e trabalhista para
essas empresas. Porém, com o passar do tempo tais simplificações ficaram aquém
das necessidades dos micro e pequenos empresários, o que deu ensejo à
promulgação da Lei Complementar 147, de 07/8/2014, que estabeleceu o
“Supersimples” para as ME e EPP, tornando ainda mais simples o seu de registro e
o regime tributário. Todavia, as alterações promovidas pela LC 147/2014 não se
limitaram às questões de ordem tributária, tendo se estendido também a outras
leis do Sistema Jurídico Brasileiro, entre elas a Lei 11.101/2005 que, ao
regulamentar a recuperação judicial e extrajudicial e a falência do empresário
e da empresa, estabeleceu, no art. 70, o “plano especial para ME e EPP”, que
consiste num parcelamento do passivo quirografário em até 36 (trinta e seis)
meses, em valores iguais e sucessivos, corrigido monetariamente e acrescido de
juros de 1% a.m. Ou seja, o plano especial para ME e EPP foi criado para
afastar a complexidade e o custo exigido para a convocação e realização da
Assembleia Geral de Credores (AGC), como ocorre na recuperação judicial das
demais empresas (recuperação judicial comum). Assim, para facilitar a
recuperação judicial da ME e da EPP e dar-lhes maior poder de voto na AGC das
demais empresas em recuperação judicial, a LC 147/2014, através de art. 5º,
efetuou alterações significativas da Lei 11.101/2005. Na recuperação judicial comum,
as alterações transformaram a ME e EPP em credores com destaque na AGC, uma vez
que: poderão ter um representante no Comitê de Credores a ser constituído na
AGC; deixaram de figurar na AGC como credores quirografários (Classe III), pois
agora compõem a novíssima Classe IV; e nas deliberações sobre o plano de
recuperação judicial (PRJ) passarão a votar a proposta do devedor por maioria
simples dos credores presentes, independentemente do valor de seus créditos,
como já ocorre com os credores trabalhistas e titulares de crédito decorrente
de acidente de trabalho. No caso de estarem com problemas econômico-financeiros,
a ME e EPP terão agora uma recuperação judicial com um plano especial mais
atraente, pois as alterações trazidas pela LC 147/2014 – além de reduzirem o
seu custo com a limitação da remuneração do administrador judicial para 2% e o
prazo de 8 para 5 anos se para obter uma nova concessão de recuperação judicial
– estendeu o seu plano especial de recuperação judicial para todos os créditos
existentes na data do pedido, ainda que não vencidos, excluídos os decorrentes
de repasse de recursos oficiais, os fiscais e os revistos nos §§ 3º e 4º do
art. 49 da Lei 11.101/2005 (titular da posição de proprietário fiduciário de bens
móveis ou imóveis, arrendador mercantil, proprietário ou promitente vendedor de
imóvel cujo contrato contenha cláusula de irrevogabilidade, inclusive
incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de compra e venda
com reserva de domínio, e o crédito decorrente de contrato de câmbio para
exportação). Além disso, ela estabeleceu que o parcelamento será de 36 parcelas
iguais e sucessivas, acrescida de juros equivalentes à taxa Sistema Especial de
Liquidação de Custódia-Selic podendo, inclusive, conter um abatimento da
dívida. Também ficou estabelecido que, no caso de as Fazendas Públicas e o Instituto
Nacional do Seguro Social-INSS deferir, por lei, parcelamento de crédito para as
empresas em recuperação judicial, que a ME e a EPP tenham um prazo 20% superior
àqueles concedidos às demais empresas. De outro lado, o pedido de recuperação da
ME ou da EPP será julgado improcedente, com a decretação de falência do
devedor, se houver objeção ao plano por parte de mais da metade de qualquer uma
das classes de credores a ele sujeitos. Já na falência, o crédito de titular
enquadrado como ME e EPP tem agora privilégio especial e passou a ocupar a quarta
posição na classificação dos créditos a serem pagos. Em suma, as alterações da
Lei 11.101/2005 criaram diversas vantagens para as ME e EPP, sendo a mais
relevante a do artigo 71, uma vez que os credores trabalhistas e os decorrentes
de acidentes do trabalho e os credores com garantia real serão também
abrangidos pelo plano especial de recuperação. Por fim, com a entrada em vigor
da LC 147/2014 na data de sua publicação (art. 15), cujas exceções não incluem
as alterações da Lei n. 11.101/2005, fica a dúvida a respeito de sua aplicação
aos processos de recuperação judicial e falência em andamento. Essa questão de
direito intertemporal é relevante, mas o problema da eficácia da lei no tempo tem
solução uniforme decorrente do princípio da irretroatividade da lei nova em
relação ao direito adquirido, ao ato jurídico perfeito e à coisa julgada (art.
5º,XXXVI, CF/!988), o que significa que a nova lei nova deverá respeitar os
atos e os efeitos dos atos praticados sob a égide da lei revogada. Logo, nas
ações de recuperação judicial em andamento, em que já houve a publicação da
lista de credores elaborada pelo Administrador Judicial para fins de formação do
quadro geral de credores, e, consequentemente, do Comitê de Credores e do
quórum para votação na AGC (art. 8º) – os processos seguirão os termos da Lei
n. 11.01/2005 na sua redação original, isto é, os credores enquadrados como ME
e EPP continuarão a figurar na Classe III.
Fonte:
JC
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