Com a “forte desaceleração” experimentada
em 2014, o Brasil integra o grupo das economias que “estão ficando para trás”,
segundo a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine
Lagarde. O desempenho não pode ser atribuído a um padrão comum dos mercados
emergentes ou ao cenário externo isoladamente, sugeriu ela, pois todos os
grupos de países apresentam atualmente casos de sucesso e de fracasso, diante
do mesmo panorama mundial. Ou seja: são fragilidades e deficiências próprias as
raízes dos problemas de quem perdeu fôlego ao longo de 2014, como o Brasil.
— O que notamos claramente, na análise que
fazemos, é cada vez mais especificidade de cada país. Não é mais como se um
grupo de países, economias avançadas ou mercados emergentes, esteja se
recuperando e o outro esteja ficando para trás. Dentro de cada grupo, alguns
países estão à frente e outros estão ficando para atrás — explicou Lagarde. Essas
forças opostas estão se neutralizando e segurando a recuperação global, criando
o que Lagarde chamou de “risco do novo medíocre”. Este é um cenário no qual a
comunidade internacional se acostumaria com um baixo ritmo de atividade, que
seria o possível, em vez de agir para destravar o crescimento. O Fundo revisou
esta semana a projeção de expansão da economia mundial em 0,1 ponto percentual
este ano, para 3,3%, o que significa patinar no mesmo patamar dos dois anos
anteriores. Para 2015, o organismo espera um pouco de tração, com taxa a 3,8%,
mesmo assim, 0,2 ponto menor do que em julho, quando esperava-se que, no
próximo ano, finalmente a barreira psicológica dos 4% seria vencida. Os sinais
do peso da especificidade no comportamento das economias estão evidentes nos
panoramas para os quatro principais blocos ricos e mercados emergentes,
exemplificou a diretora-gerente do FMI:
— Nos países ricos, claramente a
recuperação é puxada pelos Estados Unidos e Reino Unido, enquanto a zona do
euro e o Japão estão ficando para trás. Nos mercados emergentes, temos um
crescimento razoavelmente forte, ainda que mais lento, na China e (crescimento)
melhor do que o esperado na Índia. E claramente temos uma forte desaceleração
em países como Brasil e Rússia. As previsões do FMI confirmam esta divisão.
Itália (com retração de 0,2%, terceiro ano seguido de recessão), Rússia (0,2%)
e Brasil (0,3%) terão em 2014 as menores taxas de expansão da atividade entre
as principais economias. Na zona do euro, os quatro principais motores
(Alemanha, França, Espanha e Itália) tiveram redução da expectativa de
crescimento em 2014, ranking que, em magnitude do corte, foi liderado por
Brasil (um ponto) e Japão (0,7 ponto). O mercado financeiro já discute o risco
de a economia alemã estar em recessão.
Estados Unidos, com previsão de crescimento
de 2,2% (alta de 0,5 ponto sobre julho), e Reino Unido, com alta do Produto
Interno Bruto (PIB) estimada em 3,2% em 2014, foram destaques positivos dos
documentos divulgados esta semana. Bem como China (7,4%) e Índia (5,6%, alta de
0,2 ponto percentual).
O
PAPEL DOS BANCOS CENTRAIS
Algumas respostas necessárias são comuns
aos retardatários, apesar da especificidade dos problemas, disse Lagarde. As
ações expansionistas dos bancos centrais devem continuar e as políticas fiscais
precisam serem relaxadas para elevar o incentivo à retomada na Europa e no
Japão. Emergentes, por sua vez, devem estar particularmente atentos a possíveis
novas turbulências, geradas especialmente pela esperada alta dos juros dos EUA
em meados de 2015.No entanto, isso é pouco. A diretora-gerente afirmou que o
mundo precisa de uma nova etapa, após os estímulos fiscais e monetários e a
limpeza de balanços de bancos e empresas detonados na crise de 2008: reformas
estruturais e investimento pesado em infraestrutura. O FMI acredita que,
combinados, estes esforços podem ser o combustível que falta para religar as
turbinas globais. É o novo mantra da instituição.
— Acreditamos que reformas estruturais são
muito importantes. Temos recomendado enfaticamente que o investimento em
infraestrutura pode ser uma forma significativa de estimular o crescimento no
curto prazo, ao colocar as pessoas para trabalhar, lançar grandes esforços de
construção, mas também ter impacto de médio prazo no lado da oferta ao
facilitar e acelerar a criação de valor para mais tarde — explicou Lagarde. As
reformas, porém, reformas devem respeitar as especificidades dos países,
enfatizou a diretora-gerente:
— (As reformas) devem ser bem ajustadas
para serem politicamente palatáveis e terem o máximo de efeito multiplicador
nas economias. É uma questão de fazê-las, não só de falar sobre elas.
REFORMAS
TRABALHISTAS
Há duas recomendações extensivas ao Brasil
na “Agenda de Política Global”, que formam as recomendações da gerência
executiva do Fundo aos países-membros, aos quais cabem a orientação final do
foco do FMI. Lagarde acredita que a reforma trabalhista é uma prioridade para o
país. Medidas devem ter alto custo-benefício, ser focadas em treinamento de mão
de obra e englobar cortes seletivos dos impostos patronais. O conselho serve
ainda para EUA, China, Índia e África do Sul. A redução de barreiras ao
comércio exterior e ao investimento seriam outras contribuições importantes à
melhora do ambiente econômico. A diretora-gerente, no documento, salienta ainda
a necessidade de o Brasil precisa atuar para reduzir os gargalos de
infraestrutura. O objetivo é elevar o crescimento potencial da economia no
médio prazo. Lagarde destacou ainda que, se forem bem planejados, os investimentos
públicos em infraestrutura sequer representam risco à disciplina fisca.
— Não só o investimento em infraestrutura é
favorável ao crescimento, é favorável até à dívida, se feito sob as condições
certas, se a economia está fraca, se as condições de financiamento continuarem
sendo liquidez a custo baixo.
Fonte:
O Globo
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