É comum encontrar pessoas usando
freneticamente seus cartões de débito e de crédito, algumas ainda assinando
cheques, comprando o que é necessário e o que não é sem atentar para as
consequências do endividamento que será pago, depois, com os abusivos
hiperjuros. Hiperjuro foi uma palavra usada para explicar “o juro
estratosférico praticado no Brasil” (Mauro Halfeld, 2002) calculado ao modo de
juros compostos. Os juros compostos, também chamados capitalizados, são aquela modalidade
de juros que “fluem dos próprios juros” (Miranda, P.), ou seja, são aqueles que
incidirão não apenas sobre o valor principal e corrigido da dívida, mas também
recairão nos juros que já haviam sido computados sobre o saldo devedor, dia a dia,
mês a mês, ano a ano, e assim por diante. A conta é assim: se R$ 100 são
emprestados a uma taxa de juros capitalizados de 10% ao mês, ao final de um ano
a dívida a ser paga custará R$ 313, equivalente a 214% do valor inicialmente
emprestado. Caso o empréstimo de R$ 100 perdure por cinco anos, serão devidos
aproximadamente R$ 30 mil ao emprestador, ou seja 30348 %, devido ao hiperjuro.
Essa é a mágica dos juros compostos: 30348 % por haver passado um período de 5
anos. Fácil é notar, a multiplicação exponencial da dívida é absurdamente onerosa,
constituindo verdadeiro enriquecimento sem causa para quem emprestou o dinheiro
a juros compostos e amargo empobrecimento para quem pagou essa dívida com
hiperjuros. Ora, entre as décadas 80/90, quando houve hiperinflação – inflação de
mais de 60% ao mês, chegando em 1989 ao cúmulo de alcançar 1782,9% ao ano - aí
sim poderia haver alguma justificativa para os bancos trabalharem oferecendo
dinheiro a juros capitalizados porque essa seria a forma dessas instituições financeiras
se protegerem do risco de emprestar dinheiro. Acontece que, desde 1996 a
inflação vem se mantendo em aproximadamente 1% (um por cento) ao mês, o que
impõe o fim da farra dos juros compostos, especialmente em se tratando dos
bancos que, coincidentemente, estão cada vez mais lucrativos, mesmo em tempos
de crise econômica. São milhões de brasileiros utilizando o cheque especial, o
financiamento no cartão de crédito e outros produtos financeiros calculados via
saldo devedor a juros capitalizados, gerando abissal desequilíbrio na economia
da nação. Mas nem sempre foi assim. Em 1850, o art.253 do Código Comercial proibia
“contar juros sobre juros” e no início do século passado foi editada a Lei da
Usura (Decreto 22.626/1933) extirpando os excessos e as abusividades praticadas
na cobrança dos juros sobre os juros. No ano de 1963 o Supremos Tribunal Federal
(STF) publicou a súmula n° 121 determinando que “é vedada a capitalização de
juros, ainda que expressamente convencionada”, contudo, já no tempo da ditadura
Militar, a Súmula 596 (STF-1976) discriminou que a Lei da Usura não se
aplicaria mais às operações realizadas por instituições financeiras. Em 1988,
vivendo a democracia, tivemos a promulgação da atual Constituição Federal
Brasileira, apelidada de Constituição Cidadã, que tem como fundamento a
dignidade o favorecimento da pessoa humana diante das relações jurídicas
contratuais, certificando a todos uma existência digna. Ainda, pouco depois, em
1990, foi editado o Código de Defesa do Consumidor, Lei nº8.078, cujo artigo
39, veda expressamente ao fornecedor de produtos ou serviços – e aqui se
incluem as instituições financeiras (Súmula 297 /2004) - dentre outras práticas
abusivas, proíbe exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva, sendo nulas
(art. 51 do CDC) as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos
ou serviços abusivos. No ano de 2002 o novo Código Civil permitiu a
capitalização de juros no mútuo de fim econômico desde que com periodicidade
anual (art. 591), e de acordo com essa mesma lei (art.406 e 591 do CC), os
juros compensatórios deveriam respeitar a taxa em vigor para a mora do
pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional - a SELIC, o que, infelizmente,
está longe, muito longe da nossa realidade. Infelizmente, os tribunais ainda
insistem na tese de que não haveria sido derrogada a MP 2.170-36 (2001)
permitindo a capitalização em períodos inferiores a um ano nas operações de
instituições financeiras e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu
uniformizar a orientação de que é admissível a capitalização de juros com
periodicidade inferior a um ano para os contratos bancários e financeiros
pactuados, depois da data de 31 de março de 2000. Quanto ao STF, nos últimos
anos as instituições financeiras vêm conseguindo tornar inaplicável a Súmula
121/STF (que veda o anatocismo) graças à introdução da MP 1963-17/00, mas,
recentemente o Presidente da Corte Maior causou surpresa quando, em uma das sessões,
apresentou a análise da lucratividade bilionária dos bancos ao longo dos
últimos 30 anos, demonstrando que o resultado de 15 instituições financeiras no
terceiro trimestre de 2008 foi maior que a soma do resultado de 201 empresas de
outros segmentos. Diante dessa corajosa atitude, renovam-se as esperanças de
que os julgadores voltem a fazer justiça para os cidadãos brasileiros,
especialmente com relação ao pagamento de juros sem abuso, como manda a nossa
Constituição!
Fonte:
JC
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