Caderneta foi criada
em 1861, durante o reinado de Dom Pedro II. Rendimento baixo e endividamento da
população 'esvaziam' aplicação.
A caderneta de poupança completa este mês 155
anos de existência – ela foi criada pouco depois da Caixa Econômica Federal, em
1861, na época do imperador Dom Pedro II. O objetivo era receber "as
pequenas economias das classes menos abastadas", e assegurar "sob
garantia do Governo Imperial, a fiel restituição do que pertencer a cada
contribuinte, quando este o reclamar".
Desde então, se tornou a aplicação mais
tradicional do país: no final de 2015, os brasileiros tinham R$ 656 bilhões
investidos na caderneta – para comparação, se os poupadores juntassem esse
dinheiro, chegariam perto de comprar as quatro maiores empresas do país com
ações em bolsa: Ambev, Itaú, Bradesco e Petrobras (ao final de 2015, elas
valiam, juntas, R$ 640 bilhões). O sucesso da caderneta é resultado de uma
série de fatores: considerada um investimento seguro, ela tem rendimento
garantido, é isenta de imposto de renda e fácil de investir – não há limite de
valor para a aplicação nem prazo para resgate, e a burocracia é a mesma de uma
abertura de conta em banco. Essa popularidade, no entanto, tomou um tombo em
2015: de janeiro a dezembro os brasileiros tiraram R$ 53 bilhões desse
investimento. É o pior resultado para um ano da série histórica do Banco
Central, que começa em 1995.
Segurança
Segundo a Caixa Econômica Federal, a poupança
foi inicialmente concebida como uma "reserva monetária para as camadas
mais pobres da população", um pé-de-meia que serviria de socorro nos
momentos mais difíceis, inclusive como uma garantia para a velhice. Com a
garantia do poder público, a poupança foi considerada um investimento seguro,
garantido. Hoje, os depósitos na caderneta têm garantia até R$ 250 mil, pelo
Fundo Garantidor de Crédito (FGC) – se o banco tiver dificuldades ou quebrar,
esse fundo (formado por recursos dos próprios bancos) é responsável por
ressarcir o poupador.
Escravos
e mulheres casadas
A partir de 1871, foi aberta a possibilidade
de os escravos fazerem depósitos na caderneta, com dinheiro de doações,
legados, heranças, ou de algum trabalho. Os escravos recebiam uma caderneta de
controle de depósitos e retiradas, segundo a Caixa. "A única diferença é
que na caderneta deles constava o nome do seu senhor, uma vez que era
necessária a autorização deste para que a conta do escravo fosse aberta",
afirma a instituição. Já as mulheres casadas só puderam investir na caderneta
mais tarde, em 1915 – desde que não houvesse oposição do marido.
Rendimento
Em seu início, a poupança já garantia aos
brasileiros um rendimento de 6% ao ano. A regra foi alterada várias vezes, mas,
desde então, quem aplicou na caderneta viu o dinheiro render pelo menos isso em
quase todo o tempo – a exceção foi um período de pouco mais de um ano, entre
2012 e 2013. Mas essa redução no rendimento pode voltar a
acontecer: ela foi resultado de uma alteração nas regras da poupança feita no
início de maio de 2012. Até então, o rendimento era fixado em 0,5% ao mês
(6,17% ao ano), mais a variação da TR. A partir da mudança, esse rendimento
passou a valer apenas quando a taxa Selic – a taxa básica de juros do Banco
Central – fosse superior a 8,5%. Abaixo disso, o rendimento equivale a 70% da
Selic + TR. O objetivo da mudança é evitar que, em períodos de juros baixos, os
investidores "inundem" a poupança – já que o rendimento da caderneta era
fixo, se tornando mais atraente que outras aplicações. Desde agosto de 2013, no
entanto, a Selic vem acima do patamar de 8,5%, garantindo aos poupadores o
rendimento de 6,17% + TR.
Por que
então os brasileiros estão deixando a caderneta?
Há dois motivos principais para a saída da
poupança. O primeiro é o rendimento: o dinheiro aplicado na caderneta, na
prática, está perdendo valor. Em 2015, o rendimento foi de 8,15%, enquanto a
inflação do mesmo período deve ficar na casa dos 10% (o dado oficial será divulgado
nesta sexta-feira). Com a alta da Selic – atualmente em 14,25% – cresce a
remuneração de investimentos como fundos de renda fixa e tesouro direto. Quem
tem dinheiro para investir, então, vai buscar um retorno maior e deixa a
caderneta. Levantamento da Associação Nacional dos Executivos de Finanças
(Anefac) feito no final de novembro, por exemplo, mostra que o retorno os
fundos de renda fixa ganhavam da poupança na maioria das situações – só ficam
menos atraentes que a caderneta caso a taxa de administração passe dos 2,5% ao
ano, em investimentos de menos de um ano, e de 3% ao ano para investimentos de
prazo mais longo. Já o segundo está ligado diretamente à crise econômica: os
brasileiros estão com menos dinheiro para investir. Isso é resultado da alta da
inflação, que eleva o custo de vida; do aumento do desemprego (que em novembro
chegou a 7,5%); e da queda dos rendimentos dos trabalhadores (em novembro, o
recuo foi de 8,8% na comparação com o mesmo mês de 2014). Além disso, o
endividamento continua alto e a inadimplência cresceu: em novembro, chegou a
5,8%, segundo o BC. Isso incentiva os poupadores a sacarem o dinheiro da
caderneta para pagar as contas.
Para
onde vai o dinheiro da poupança?
Por lei, os bancos precisam destinar para o
financiamento imobiliário 70% de tudo o que é investido na caderneta. Isso
garante que os bancos podem financiar a compra da casa própria a juros mais
modestos que os dos empréstimos pessoais, por exemplo – e a "fuga" da
poupança pode tornar esses financiamentos mais caros. Mas a mesma regra é uma
preocupação caso os brasileiros recorram em massa à caderneta, já que o
dinheiro fica impedido de ser usado para outros fins, como financiamento de
empresas.
Fonte:
G1
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