Nos sete meses do ano, setor público cumpriu só 29% da meta
original de superávit, de 3,1% do PIB. A alternativa do governo para o restante
de 2013 será incluir na contabilidade oficial recursos extraordinários para
elevar o resultado.
A política fiscal vive
uma crônica anunciada: economistas passaram o ano advertindo para o risco de o
governo não estar poupando o suficiente para cumprir a meta de superávit primário
(a economia de recursos que forma um colchão financeiro para o pagamento dos
juros da dívida pública). As projeções negativas vingaram. Nos sete primeiros
meses do ano, o setor público cumpriu parcos 29% da meta original, de 3,1% do
PIB. Se quiser fechar a conta nos meses que restam, a alternativa será recorrer
a alguns "anabolizantes" para bombar o resultado. Tomando como base
estratégias anteriores adotadas pelo governo para cumprir a meta, o economista
Felipe Salto, da Tendências Consultorias, estima que há alguns bons bilhões de
reais que podem ser incluídos na contabilidade do primário para empurrar o
resultado para cima. A parcela mais visível vem de receitas extraordinárias com
as concessões públicas. O governo previu que arrecadaria R$ 20 bilhões no ano
com as concessões e ainda há quase R$ 17 bilhões para entrar no caixa. A parcela
mais graúda é a contabilização dos R$ 15 bilhões do leilão do campo de petróleo
de Libra, que entra na conta em novembro. "É uma receita atípica, mas vai
ter um efeito positivo no resultado", diz Salto. Outra fonte promissora é
o Refis, o programa de parcelamento de dívidas junto ao governo federal. Com a
adesão dos bancos, estima-se que a receita ficará na casa de R$ 12 bilhões, que
poderão ser somados à conta do primário. O governo também poderá incluir de R$
8 bilhões a R$ 11 bilhões de dividendos que tem a receber, principalmente da Petrobras,
do Banco do Brasil e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
(BNDES). Existe ainda a possibilidade de o governo adotar medidas concretas
para controlar alguns gastos que teriam efeito positivo no primário. "Com um
pequeno esforço, acredito que o governo tem condições de economizar, de fato,
cerca de R$ 9 bilhões", diz Salto. Para salvar o resultado, o governo
ainda tem a possibilidade legal de abater da meta um total de R$ 65 bilhões,
referentes basicamente a investimentos feitos pelo Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC) e uma parcela das desonerações. "O abatimento do valor
integral ajudaria cobrir a parte de estados e municípios, que, já se sabe, não
vão conseguir cumprir a meta", afirma o economista da Tendências. De
acordo com Salto, essa engenharia financeira poderia reunir os R$ 156 bilhões
previstos, criando a ilusão de que se cumpriu a meta. "Na prática, porém,
apenas cerca de R$ 54 bilhões – um terço do total – seria resultado de um real
esforço fiscal", diz o economista.
Artificialismo
Como o governo não
demonstra que vai admitir não ter cumprido a meta pelos trâmites convencionais,
a expectativa é que recorra aos recursos extraordinários. "É plausível que
o governo faça algo assim, mas não há vantagem nisso porque pelo aspecto
fiscal, é tudo artificial: não está obtendo o resultado pelos fluxos normais da
atividade econômica", diz economista Amir Khair, especialista em finanças
públicas. Para Khair, se o governo quiser de fato cumprir a meta do primário a
partir de 2014, deve se concentrar em promover crescimento. "É assim que
se garante uma arrecadação forte que favorece a realização do superávit
primário", diz. "Mas o governo também deve parar de fixar meta para
estados e municípios, porque, pela Lei de Responsabilidade Fiscal, essa tarefa
não lhe cabe." Para o economista Fabio Giambiagi, também especialista em
finanças públicas, apesar de a arrecadação ter sido um problema em 2013, o
maior entrave foi gestão dos recursos. "O grande vilão é o gasto", diz.
Até setembro, a despesa corrente cresceu 8 % em termos reais, com incremento
real de 2 % das despesas com pessoal, de 6 % do INSS e de 10% nas chamadas
"outras despesas de custeio e capital". Nesse item, os destaques foram
os 11 % de aumento real da despesa com seguro-desemprego e os R$ 4 bilhões
pagos pelas térmicas. "O governo deveria ser mais rigoroso na execução do
gasto, mas realisticamente creio que não vai acontecer", diz Giambiagi.
Fonte: JC
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