Um mistério ronda o comércio externo
brasileiro. Por que as exportações não vão elevar o PIB, se o real está mais
fraco e o mundo vai crescer mais? O ceticismo sobre o impacto positivo do
câmbio e do crescimento mundial no comércio vem do fato de o Brasil ter poucos
acordos bilaterais, continuar amarrado ao Mercosul e não participar das grandes
cadeias mundiais de produção. O Brasil está fora da rede. Com o sétimo maior
PIB nominal do Mundo — até o último ranking divulgado — o Brasil é só o 22º
maior exportador. Nossas vendas para o exterior representam apenas 1,3% do
total vendido no mundo. A corrente de comércio brasileira é 21% do nosso PIB, o
mesmo nível de 10 anos atrás. O Brasil continua sendo um país fechado. As
projeções para 2015 são de estagnação do PIB, com risco de recessão. O consumo
está perdendo força, as incertezas suspenderam projetos de investimento. Em
pouco mais de três anos, o real perdeu 52% do valor em relação ao dólar. Em
janeiro de 2012, a moeda americana valia R$ 1,86, segundo dados do Banco
Central. No fechamento da última sexta-feira, foi cotado a R$ 2,83. Essa queda
é boa para quem exporta porque torna o produto brasileiro mais barato no
exterior. Apesar disso, ninguém espera um grande impulso nas exportações este
ano. — O Brasil tem apenas três acordos bilaterais de comércio firmados, e
apenas um está em vigor, com Israel. Tem poucos acordos bilaterais de
investimento e poucos tratados que evitam a bitributação entre países. Não faz
parte da OCDE e não integra o Centro Internacional para Resolução de Disputas
de Investimento. Tudo isso explica por que não vamos conseguir crescer pelo
canal das exportações — diz Eduardo Felipe Matias, doutor em direito
internacional pela USP e autor de livros sobre globalização, sustentabilidade e
comércio internacional. Os números mostram como o Brasil fez pouco para ampliar
sua rede de parceiros comerciais. Ficou acomodado durante o período de alta dos
preços das commodities, que agora entraram em fase de declínio. Enquanto tem
apenas três acordos bilaterais de comércio, o Chile tem 21; o Peru, 16; México,
13; e a Colômbia, 12, segundo dados de 2013 da OMC. Há ainda acordos mais
amplos, como o firmado por México, Chile, Peru e Colômbia, na Aliança do
Pacífico, uma zona de livre comércio entre eles. Em outras partes do mundo, EUA
e Europa negociam a Parceria Transatlântica. Além disso, EUA, Japão, Canadá,
Austrália, México e Chile, entre outros, negociam a Parceria Transpacífica. De
tratados que evitam a bitributação, reduzindo custos e estimulando a
internacionalização de empresas, o Brasil tem 29 fechados. Nenhum deles
assinado de 2009 para cá, segundo Eduardo Matias. Não temos tratados com EUA e
Alemanha, duas das maiores potências comerciais do mundo. Já a China possui 98,
e a Índia, 86. Quando o tema são os acordos bilaterais de investimento, que dão
segurança ao investidor estrangeiro, o Brasil também tem ficado para trás. Há
apenas 14 assinados, e nenhum ratificado. A China possui 130; a Rússia, 73; e a
Índia, 84. — Os acordos são muito amplos e vão estabelecendo uma rede jurídica
que dá proteção e segurança a vários tipos de assuntos, como propriedade
intelectual, governança corporativa, movimentação de capitais,
sustentabilidade. Estabelecem órgão internacionais de arbitragem. O Brasil não
está participando dessas discussões, que definem padrões. Para se inserir nas
grandes cadeias mundiais de produção, é preciso estar dentro de certas normas —
explicou Matias. De 2011 a 2014, as exportações brasileiras caíram 12%, de US$
256 bilhões para US$ 225 bi. O saldo comercial, que já foi de US$ 46 bilhões em
2006, virou déficit de US$ 4 bilhões no ano passado. O período de boom das
matérias-primas ficou para trás, com preços menos favoráveis para o minério de
ferro e a soja. Não foi por falta de aviso. Inúmeros especialistas alertaram
para a necessidade de negociação de acordos de comércio. O Brasil preferiu
esperar pelo sucesso da Rodada Doha, que não veio, aceitar todas as limitações
que a Argentina impôs às negociações brasileiras. Hoje, a Argentina está cada
vez mais próxima da China, que passou o Brasil no comércio com o nosso vizinho.
É preciso repensar a estratégia comercial do
país.
Fonte:
M. Leitão/A.Gribel
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