Estatal antecipou R$
1,3 bilhões referentes a acordo com Eletrobras fechado em maio.
A Petrobras pode ser forçada a republicar o
balanço do primeiro trimestre se for comprovado que ela recorreu a mecanismo
contábil para elevar o resultado divulgado na semana passada, indicou ontem o
presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Leonardo Pereira. A
estatal contabilizou ganho de R$ 1,3 bilhão fruto de um contrato assinado
apenas no dia 7 de maio — 37 dias após o fim do primeiro trimestre — e ajudou a
empresa a registrar lucro de R$ 5,3 bilhões de janeiro a março. A informação
sobre o artifício foi publicada ontem pelo jornal “Folha de S.Paulo”. Sem
comentar o caso específico da Petrobras, o presidente do órgão regulador do
mercado de capitais afirmou que a republicação do balanço é a medida exigida
pela CVM quando empresas abertas desrespeitam as orientações do Comitê de
Pronunciamentos Contábeis (CPC), que elabora pareceres sobre contabilidade
empresarial. — Se ficar comprovado que uma empresa desrespeitou a norma do Comitê
de Pronunciamentos Contábeis (CPC) sobre esse assunto, pode ter que republicar
(o balanço) — disse Pereira em evento, em São Paulo, da Associação Brasileira
das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), de acordo com a
agência Reuters. A manobra contábil se refere às provisões feitas pela
Petrobras para um possível calote da Eletrobras, que recebia combustível da
petrolífera em usinas termoelétricas na Região Norte. Essa reserva, que
totalizava R$ 4,5 bilhões, pesou negativamente no balanço referente a 2014. Nas
demonstrações financeiras do primeiro trimestre de 2015, porém, a Petrobras
informou que “em 31 de março de 2015, a companhia reverteu R$ 1.295 (em milhões
de reais) de perdas em créditos de liquidação duvidosa”. Mas ela admite que
isso ocorreu “em função da assinatura, em 7 de maio de 2015, de novo contrato”
com a Eletrobras, garantindo a dívida. Segundo a Petrobras informou em nota,
embora formalizado em maio, o contrato começou a ser negociado em março de 2015
— logo, ainda no período coberto pelo balanço. A companhia alegou que a
inclusão do evento no documento está de acordo com o Pronunciamento Técnico 24,
do CPC. Justificando sua inclusão no balanço, a empresa classificou o contrato
com a Petrobras de “evento subsequente de caráter modificativo e ocorrido antes
da emissão das informações trimestrais, com complemento efetivo de garantias e
consequente melhoria do crédito”. O GLOBO não conseguiu contatar, por telefone,
o Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC). Em nota, a CVM disse que acompanha
as movimentações de companhias abertas, “tomando as medidas cabíveis, quando
necessário”. A autarquia citou como referência para o caso justamente o
Pronunciamento Técnico 24 do CPC, mas não informou se a conduta da Petrobras
está de acordo com ele. — Existe, sim, a possibilidade de um evento posterior
ao período do balanço ser lançado. Isso já aconteceu várias vezes. Não sei se,
no caso da Petrobras, ela o fez da maneira correta, mas isso acontece com
diversas empresas. E, para dar seu aval, a auditoria que assinou o balanço
certamente considerou a conduta correta — afirmou Rafael Paschoarelli Veiga, da
FEA/USP.
ESPECIALISTA VÊ PEDALADA
Mas o artifício é considerado questionável
por outros especialistas em contabilidade. — Eu desaconselharia essa prática,
pois fere um princípio contábil. O resultado precisa estar dentro do trimestre,
pois o fato gerador aconteceu depois do fechamento. O ideal seria que o fato
estivesse nas notas explicativas, mas que só fosse contabilizado no próximo
trimestre — avaliou Alexandre Espírito Santo, economista da Simplific Pavarini
e professor do Ibmec-Rio. O professor de Finanças Públicas da Escola de
Administração da Fundação Getúlio Vargas (FGV/EASP) Fernando Zilveti também
recomendou que o contrato com a Eletrobras se restringisse às notas
explicativas. Segundo ele, a manobra tinha como objetivo mostrar para o mercado
que a empresa está em uma posição melhor: — Foi nitidamente uma pedalada para
embelezar o balanço. Se ela queria antecipar um fato contábil, deveria ter
colocado nas notas explicativas.
Fonte:
O Globo
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