Com CPMF, país terá
93 tributos em vigor.
O brasileiro que toma um cafezinho na padaria
paga 16,5% de imposto sobre o pó de café, mais 30,6% sobre o açúcar, sem falar
nos 37,8% de taxas que incidem na água. Muita gente nem se dá conta, mas o país
vive sob uma montanha de impostos. Se a CPMF ressuscitar no Congresso, como
deseja o governo, serão 93 tributos em vigor, considerando impostos, taxas e
contribuições, de acordo com levantamento do site Portal Tributário. Segundo
Roberto Haddad, sócio da consultoria KPMG, não se tem notícia de um país com
número tão grande de tributos diferentes. — O Brasil é o país com a maior
quantidade de taxas e impostos diferentes do mundo. É difícil explicar esse
sistema tributário a uma empresa estrangeira que quer se instalar no país.
Fazemos um guia de impostos, mas ele dura em média dois anos porque as coisas
mudam sempre — diz Haddad.
Há países com carga tributária ainda maior do
que a brasileira, de 35,42% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo cálculo do
Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), mas a diferença é que o
retorno em bem-estar a seus cidadãos é muito superior ao oferecido no Brasil.
De cada R$ 10 produzidos pelo país, R$ 3,50 são recolhidos em forma de impostos
aos cofres da União, dos governos estaduais e municipais. Se a CPMF com
alíquota de 0,2% passar, o valor subirá para R$ 3,60. Segundo especialistas,
cargas tributárias de 30% do PIB são preocupantes e acima de 35% são
indesejáveis porque travam o crescimento da economia.
BAIXO RETORNO EM SAÚDE, EDUCAÇÃO E SEGURANÇA
Um estudo do IBPT reuniu os 30 países com
maior carga tributária e relacionou o recolhimento de impostos aos benefícios
recebidos pela população, usando o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), uma
medida da qualidade de vida. No ranking, o Brasil ficou na última posição,
atrás de países como Argentina e Uruguai. — Quando se leva em conta o retorno
baixíssimo que o brasileiro tem em termos de saúde, educação e segurança, é
possível dizer que temos a maior carga tributária do mundo, já que ficamos em
último lugar no ranking de benefícios oferecidos à população com esses
recursos. O país não tem uma política tributária que taxe o cidadão de acordo
com sua capacidade de contribuir. Tem uma política de arrecadação para fazer
caixa, que é resultado da ineficiência do Estado em administrar seus recursos —
diz João Eloi Olenike, presidente executivo do IBPT. A Dinamarca, por exemplo,
tem carga tributária de 45,2% do PIB, com a cobrança de 14 taxas e impostos,
segundo o órgão tributário do país. Na Espanha, com carga tributária de 32,6%
do PIB, existem 13 tipos de cobranças em vigor. E a Argentina, com carga de
31,2% do PIB, cobra 85 taxas e impostos, segundo a Administração Federal de
Ingressos Públicos. — Temos a maior carga tributária de nossa história, mas não
conseguimos fechar as contas no azul e nem oferecer retorno de qualidade à
população. É a constatação de que os recursos estão mal empregados. Ao cobrar
corte de gastos do governo e rejeitar novos impostos para levar adiante o
ajuste fiscal, a sociedade está pedindo que o Estado diminua de tamanho —
avalia Fernando Zilveti, advogado tributarista e professor de Finanças da
Fundação Getúlio Vargas de São Paulo. Até a primeira quinzena de setembro, os
brasileiros já haviam desembolsado R$ 1,4 trilhão em impostos. O valor foi
registrado 16 dias antes do verificado no ano passado e, até o fim do ano, deve
atingir os R$ 2 trilhões (cerca de US$ 526 bilhões), o equivalente ao PIB da
Suécia.
‘QUEM GANHA MENOS PAGA MAIS’
O país chegou a esse ponto, segundo os
especialistas, por uma deficiência do Estado brasileiro, que há muito tempo
mostra-se incapaz de administrar suas contas. Desde a década de 1980, a carga
tributária subiu de 22% do PIB para a faixa dos 35% atuais, acompanhando o
crescimento dos gastos públicos da União, estados e municípios com contratação
de pessoal, obras e as chamadas despesas obrigatórias, entre outros. Somente no
ano 2000, surgiu a Lei de Responsabilidade Fiscal, que impôs controle sobre o
gasto público, vinculando toda despesa a uma fonte de receita. Só que quando a
economia encolhe ou cresce pouco, a arrecadação cai, mas as despesas se mantêm.
Para os especialistas, os impostos embutidos
nos preços de cada produto, como o cafezinho, são os piores, porque são pagos
igualmente por quem ganha R$ 100 mil ou um salário mínimo. Proporcionalmente, é
o cidadão com renda menor que paga mais. O Brasil é o país com a maior carga
tributária em impostos invisíveis pagos na ponta do consumo, de acordo com
Zilveti. No Brasil, os impostos sobre o consumo equivalem a 70% da arrecadação.
No Chile, eles são responsáveis por 50,1% da arrecadação, no Japão, por 18%, no
México, por 54% e nos EUA, 17,9%, segundo dados da Organização para Cooperação
e Desenvolvimento Econômico (OCDE). — Isso provoca uma distribuição de renda ao
contrário, ou seja, quem ganha menos paga mais imposto. A maior arrecadação vem
do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), que está em todos
os serviços e produtos — diz Olenike, do IBPT. Na Europa, taxa-se o consumo por
meio do Imposto de Valor Agregado (IVA). Mas é um imposto único que incide em
toda a cadeia produtiva e fica em média em 20%. Aqui, a diferença é que há uma
cascata de tributos, como o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI),
Pis/Cofins e ICMS. Neste último, existem diferentes alíquotas entre os estados,
incidindo na cadeia produtiva. Para o consumidor, o resultado é que numa série
de produtos, como cosméticos e perfumes, a carga tributária supera 50%. Na
prática, mais da metade do preço é imposto.
Fonte:
O Globo
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